Renato Freitas reassume o mandato na Câmara de Curitiba

por José Lázaro Jr. — publicado 10/10/2022 11h20, última modificação 10/10/2022 21h42
Vereador obteve uma liminar no STF que suspende a cassação do mandato. Sessão teve nova discussão sobre racismo em Curitiba e troca de acusações entre vereadores.
Renato Freitas reassume o mandato na Câmara de Curitiba

Vereador Renato Freitas discursa em plenário no dia do seu retorno ao Legislativo. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

Nesta segunda-feira (10), o vereador Renato Freitas (PT) retornou ao plenário da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), após obter no Supremo Tribunal Federal (STF) uma liminar que suspendeu a cassação do seu mandato. No dia 5 de agosto, há dois meses, em dois turnos, por 23 a 7, a maioria dos vereadores da CMC ratificou o entendimento do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar que Freitas deveria perder o mandato por ter realizado manifestação política dentro da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (PED 1/2022). No momento, além de recuperar as prerrogativas regimentais, Freitas tem validados os 57.880 votos que obteve para deputado estadual, conquistando uma vaga para a Assembleia Legislativa do Paraná.

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, no dia 23 de setembro, acatou liminarmente o argumento da defesa de Renato Freitas de que a CMC descumpriu prazos para cassar o mandato do parlamentar. A situação, contudo, segue em discussão, pois, na última sexta (7), a Câmara de Curitiba entrou com um recurso defendendo a aplicação do Regimento Interno no caso. Se Barroso não exercer o juízo de retratação, alterando a liminar, o caso passa automaticamente para a Primeira Turma do STF, que é presidida pela ministra Cármen Lúcia e, além de Barroso, é composta por Dias Toffoli, Luiz Fux e Alexandre de Moraes.

O argumento da defesa de Freitas é que a CMC deveria ter cumprido o prazo de 90 dias corridos contido no decreto-lei 201/1967, mas o entendimento da Câmara de Curitiba é que prevalece a contagem estabelecida no Regimento Interno do Legislativo, que é de 90 dias úteis. “Os atos no bojo do processo ético disciplinar foram realizados em estrita observância ao Regimento Interno da Casa, com máximo respeito à ampla defesa e ao contraditório”, defendeu Tico Kuzma, presidente da CMC, por ocasião do protocolo do agravo regimental, no STF, na sexta-feira.

“É importante esclarecer que a questão objeto da Reclamação [de Freitas, no STF] diz respeito tão somente a obrigatoriedade ou não de aplicação da norma federal decreto-lei 201/1967 nos casos de perda de mandato por quebra de decoro, o que tradicionalmente é classificado como infração político-administrativa, espécie não abrangida pela Súmula Vinculante 46, a qual faz referência apenas aos crimes de responsabilidade, conforme reafirmado pela desembargadora Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, do Tribunal de Justiça do Paraná, em informação prestada ao ministro Barroso”, justificou Kuzma.

“Batalha contra o racismo”
Primeiro a falar em plenário nesta segunda-feira, Renato Freitas abriu seu discurso afirmando que viveu uma “batalha contra o racismo, contra a hipocrisia e contra a maldade”. “Quero agradecer aos vereadores que tentaram me cassar, afundados em sua própria cobiça, cegueira e ódio. [Eles] tornaram possível e pública uma questão importante, [sobre] qual o papel da igreja na luta contra o racismo, das Casas Legislativas contra o racismo, da sociedade curitibana contra o racismo”, declarou o vereador.

“Aquele que não ama o seu próximo é sete vezes maldito, enquanto aquele que faz do seu próximo um inimigo é 70 vezes maldito. Os homens de ódio só conseguem amar a si próprios, os homens de orgulho não suportam os seus iguais, os homens de cobiça querem ouro e títulos, os homens de rapina espreitam os fracos para despojá-los, não para lhes assegurar a saúde”, disse Renato Freitas. A íntegra da fala do parlamentar, na qual ele detalhou mais desses tipos, buscando interlocutores no plenário, está disponível no canal da CMC no YouTube (veja aqui). 

“Ataca a nossa fé”
No pequeno expediente, Osias Moraes (Republicanos), Mauro Ignácio (União) e Ezequias Barros (PMB) se opuseram à afirmação que a cassação de Freitas foi motivada por racismo. “O que tem que ficar claro é que ele não foi cassado por ser negro, ele foi cassado por que é um experimento da esquerda para quebrar os limites da sociedade. Não somos cegos nem burros. Quem vê os vídeos vê que o vereador Renato Freitas invade a igreja, que o padre para a missa cinco vezes”, contestou Moraes. “Você ataca o cristão, ataca a nossa fé, é contra quem prega o evangelho, e se é essa guerra que você quer aqui dentro, nós não ficaremos mais calados contra as suas falácias”, afirmou o vereador do Republicanos.

Reforçando a fala de Osias Moraes, para quem Freitas voltou à CMC graças a uma “manobra [jurídica]”, Mauro Ignácio fez críticas à decisão do STF que suspendeu a cassação do parlamentar. “Será que vamos ter que queimar o Regimento Interno?”, protestou, reclamando que o caso foi avaliado pelo Supremo Tribunal Federal de forma relâmpago. “Será que o recurso da CMC vai ser julgado com a mesma velocidade?”, questionou Ignácio. “Quero discordar da forma como [Freitas] voltou, acusando todo mundo. Em vez de apaziguar, [opta] por tacar fogo no circo. Cada um prestará contas de si à sociedade e a Deus. A gente tem que mudar de pauta, essa cidade não merece essa discussão”, completou Barros.

“Não teve privilégio”
Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar durante o Processo Ético Disciplinar 1/2022, Dalton Borba (PDT) comentou as falas dos outros vereadores, apontando o que julgou serem erros nas falas. “Das representações oferecidas contra o mandato [de Freitas], restou apenas uma única imputação, que foi a de movimento político dentro da igreja. Não se deve imputar [a ele] nenhum outro tipo de conduta. Crime ele não cometeu. Não se deve imputar a ele responsabilidade de ter invadido, pois [a conduta] não foi aceita pelo Conselho de Ética”, argumentou Borba.

Dizendo que não se pode encarar o caso “de maneira tendenciosa”, Dalton Borba  afirmou que, no seu entendimento, “não houve qualquer tipo de privilégio na condução desse processo junto ao STF”. Havia a necessidade de um julgamento emergencial, segundo Borba, por haver um processo eleitoral em curso. "Se o STF se calasse, o direito pereceria. Devemos ter uma certa objetividade no trato com as instituições, pois estamos em um período eleitoral onde a democracia vem sendo fortemente atacada. Tenho respeito pela decisão da CMC, mas quero lembrar que alertei para o fato que o prazo estava sendo mal interpretado”, concluiu.