CMC acata campanha educativa contra pobreza menstrual

por Fernanda Foggiato | Revisão: Vanusa Paiva — publicado 08/03/2022 12h15, última modificação 09/03/2022 15h04
A Campanha de Conscientização do Ciclo Menstrual, proposta por Maria Leticia, poderá contemplar a oferta de absorventes nas escolas municipais.
CMC acata campanha educativa contra pobreza menstrual

“Quando falta absorvente, falta estrutura”, explicou Maria Leticia sobre o “tripé” da pobreza menstrual. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

No Dia Internacional da Mulher, o plenário da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) concordou com projeto de lei para criar a Campanha de Conscientização do Ciclo Menstrual. A proposta, da vereadora Maria Leticia (PV), alerta para a pobreza menstrual, que põe em risco a saúde de meninas, mulheres e homens trans que não têm recursos para comprar o item básico de higiene pessoal, assim como acesso ao saneamento básico e à educação menstrual.

Com 34 votos favoráveis e 2 abstenções na análise em primeiro turno, a matéria retorna à pauta nesta quarta-feira (9), para a confirmação em plenário (005.00063.2021, com o substitutivo 031.00010.2022). À frente da Procuradoria da Mulher (ProMulher) da CMC no biênio 2021-2022, Maria Leticia reforçou as explicações sobre o “tripé” da pobreza menstrual: “Quando falta absorvente, falta estrutura”.

Ou seja, falta o acesso para comprar o produto de higiene básica, ao saneamento básico e à educação menstrual. Em 2014, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu o direito à higiene menstrual como uma questão de saúde pública, já que o uso de materiais improvisados, como papel higiênico, trapos e jornais, expõe as pessoas que menstruam ao risco de infecções.

Segundo a autora, estima-se que 30% das residências brasileiras não têm saneamento básico e que 2% não possuem banheiro. Dados também indicam que cerca de 710 mil meninas, no país, vivem sem chuveiro dentro de casa. “Se coloquem no lugar dessas mulheres. Como é viver sem água, sem esgoto, sem torneira e menstruar?”, citou.

Maria Leticia acrescenta que a desinformação ainda gera tabus como não lavar o cabelo, andar sem calçado ou praticar esportes durante a menstruação. Em depoimentos coletados por seu gabinete, mulheres relataram a falta de diálogo em casa como um dos principais problemas no acesso à educação menstrual.

“O que impacta muito é que 1 a cada 4 meninas falta à aula durante o período menstrual”, acrescentou. A vereadora defendeu que a distribuição de absorventes em pontos da Fundação de Ação Social (FAS) é centralizada: “Nós temos bairros de Curitiba que ficam desassistidos. E isso é um agravante”.

O que diz o projeto?
A ideia, de acordo com a proposta de lei, é promover ações educativas nas escolas municipais. As atividades, como palestras e rodas de conversas, seriam realizadas ao longo do ano e também envolveriam a orientação dos pais e responsáveis pelos alunos. Outra proposta é a capacitação dos servidores sobre o tema.

O foco da campanha seria a quarta semana de maio, em alusão ao Dia Internacional da Menstruação. O projeto também afirma que as unidades de ensino da rede municipal poderão distribuir absorventes higiênicos, calcinhas absorventes e coletores menstruais às estudantes. Os itens, sugere a vereadora, seriam comprados com repasses do Programa Fundo Rotativo, criado pela lei 14.755/2015.

Segundo Maria Leticia, a Secretaria Municipal da Educação (SME) se colocou favorável a colocar o Fundo Rotativo para a compra de absorventes. “O impacto no orçamento será pequeno. O custo do tratamento de uma doença [pelo uso de materiais inadequados], sem dúvida, é muito maior que a prevenção dela.”

Apoio à pauta
Líder do prefeito, Pier Petruzziello (PTB) elogiou a iniciativa e parabenizou a autora pela interlocução com o Executivo, “justamente para que não fosse um projeto que ficasse jogado em uma prateleira da Câmara e tivesse sucesso”. O presidente da Casa, Tico Kuzma (Pros), reforçou o diálogo: “Nós queremos que o projeto seja aprovado. Mas acima de tudo queremos que seja executado”.

“A pobreza menstrual é fruto dessa desigualdade [social]. É poder ter acesso a um produto que é caro. E, portanto, precisamos ter políticas”, pontuou a líder da oposição e segunda-secretária da Câmara, Professora Josete (PT). “Sou professora de escola pública [estadual] e muitas vezes vi as minhas estudantes não indo à escola, faltando aula, porque realmente não tinham como ir à escola no período menstrual”, relatou Carol Dartora (PT), procuradora-adjunta da Mulher na CMC.

Para Dalton Borba (PDT), o principal obstáculo para a quebra de tabus é cultural. É dele outro projeto de lei com a temática em trâmite na CMC, com a proposta de instituir a Política de Combate e Erradicação da Pobreza Menstrual (saiba mais). João da 5 Irmãos (PSL) acredita que para a quebra de tabus é necessária a conscientização dos meninos, já nas escolas. “É também um compromisso de nós homens”, concordou Marcos Vieira (PDT).

Representantes do Coletivo Igualdade Menstrual acompanharam a votação, nesta manhã. A organização já havia apoiado, nessa segunda-feira (7), ato promovido pela dignidade menstrual, realizado na praça 19 de Dezembro. Realizada por Maria Leticia, a atividade contou com a participação de outros coletivos e de representantes da seccional Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem) e da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR).

As sessões plenárias começam às 9 horas e têm transmissão ao vivo pelos canais da Câmara de Curitiba no YouTube, no Facebook e no Twitter.