CCJ aprova salvaguardas para manifestações sonoras em terreiros

por Alex Gruba | Revisão: Gabriel Kummer* — publicado 04/12/2025 18h15, última modificação 05/12/2025 18h07
Em uma pauta com 45 proposições legislativas, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de Curitiba aprovou o trâmite de 12 delas e arquivou 7. Outras 26 seguem na CCJ.
CCJ aprova salvaguardas para manifestações sonoras em terreiros

Sala das Comissões ficou lotada com representantes de terreiros acompanhando 33ª sessão da CCJ (Fotos: Júlia Schneider/CMC)

A 33ª reunião ordinária da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), nesta terça (2), foi marcada pelo debate a respeito da proposta para estabelecer salvaguardas às manifestações de religiões de matriz africana na Lei do Silêncio (005.00715.2025), por iniciativa da vereadora Giorgia Prates – Mandata Preta (PT). Além dessa aprovação, outras 11 propostas de lei receberam sinal verde para tramitar em outras comissões da Casa Legislativa, enquanto 7 foram arquivadas e outras 26 seguem tramitando na própria CCJ (leia mais aqui).

A sessão contou com a presença de representantes de terreiros e de coletivos de direitos humanos, que acompanharam de perto a discussão sobre garantias de liberdade religiosa. O debate sobre manifestações sonoras de caráter religioso evidenciou disputas que envolvem identidades culturais, racismo religioso e a atuação do poder público. A reunião se consolidou como um espaço de escuta e de afirmação da pluralidade democrática.

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A proposta da vereadora Giorgia Prates prevê a alteração na Lei do Silêncio (lei municipal 10.625/2002), para estabelecer salvaguardas às manifestações sonoras das religiões de matriz africana, reconhecendo a natureza litúrgica de atabaques e cânticos, que não se equiparam a atividades recreativas. A autora teve espaço na CCJ para defender seu projeto. 

Hoje, a legislação municipal não oferece parâmetros mínimos sobre como proceder diante de denúncia contra um terreiro. E essa ausência de diretrizes prejudica a todos, prejudica as comunidades religiosas que ficam vulneráveis às interpretações subjetivas e a práticas desiguais. Prejudica o servidor público que age sem referência legal segura, exposto a conflitos e a riscos administrativos, mesmo quando tenta cumprir o seu dever”, disse Giorgia Prates.

O projeto, segundo ela, introduz parâmetros técnicos claros para a atuação dos agentes de fiscalização, como a exigência de aferição sonora por profissional habilitado e a vedação da interrupção de cultos em andamento. Giorgia Prates destacou que práticas desproporcionais têm resultado em violações recorrentes contra comunidades afetadas por racismo religioso.

Ocorrências de perturbação de sossego

O relator Da Costa (União) explicou que inicialmente havia proposto o arquivamento, mas revisou sua posição após diálogo com a autora e consulta à Procuradoria Jurídica (Projuris) da CMC, concluindo pela devolução à autora. Como ex-policial militar e cristão, ele entendeu ser importante ressaltar a diferença entre o parecer técnico da CCJ e a atuação de um agente de segurança que vai atender uma ocorrência de perturbação de sossego.

Eu já atendi [a ocorrências policiais] em terreiro, em igreja evangélica, em festa, já atendi a diversos tipos de perturbação de sossego”, disse Da Costa, ressaltando que, em regra geral, o policial orienta para abaixar o som quando se trata de denúncia anônima. Quando o reclamante quer representar, ele explicou que o policial não tem escolha a não ser encaminhar as partes para uma delegacia.

O vereador ressaltou que não se trata de tratamento diferenciado nem de interferir na liberdade religiosa de qualquer pessoa. “Já aconteceu em igreja evangélica. Eu sou cristão, vou em igreja evangélica. E muitas vezes alguns pastores extrapolam […], colocam uma caixa de som no último volume. Eles querem, sei lá, deixar Jesus surdo de tanto que gritam. Capaz que [Ele] já esteja, porque gritam muito no ouvido Dele, e eu acho que não precisa”.

Parâmetros para fiscalizar terreiros

Camilla Gonda (PSB), por sua vez, apresentou voto em separado pela tramitação, afirmando que o projeto não invade competência administrativa do Executivo, mas disciplina o exercício do poder de polícia ambiental em conformidade com garantias constitucionais. Destacou que a legislação atual não oferece parâmetros suficientes para fiscalizações em terreiros.

O colegiado abriu espaço para a manifestação do público presente, representada por Eduardo Filho, que durante três anos foi diretor de Igualdade Racial, Povos e Comunidades Tradicionais na Secretaria de Estado da Mulher, Igualdade Racial e da Pessoa Idosa. Ele destacou que instrumentos musicais como atabaques são considerados sagrados e, por isso, não se pode retroceder quando há leis federais e estaduais que já garantem essa proteção jurídica às religiões de matrizes africanas.

Após intenso debate, o colegiado da CCJ aprovou a tramitação por maioria. Com essa decisão favorável, a proposição segue agora para análise da Comissão de Direitos Humanos, Defesa da Cidadania, Segurança Pública e Minorias.

Planta Genérica de Valores (PGV) e o IPTU

O colegiado deu sinal verde para duas proposições legislativas de iniciativa do prefeito. Uma delas dispõe sobre a Planta Genérica de Valores (PGV), os Valores Unitários de Construção e o limite para aumento do IPTU no quadriênio 2026–2029 (002.00023.2025). O projeto seguiu para a pauta da Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização.

Segundo o Poder Executivo, a proposta de revisão da PGV não implica alteração da alíquota de cobrança do IPTU, mas sim a revisão da base de cálculo, acompanhando a atualização do valor de mercado dos imóveis. Das cerca de 980 mil unidades tributáveis, a revisão da PGV impactará diretamente cerca de 55,9 mil delas, com uma “trava” de 18% mais a inflação para impedir aumentos abruptos (saiba mais). Na sessão da última terça (2), o plenário aprovou requerimento para que essa proposta de lei tramite em regime de urgência. Assim, o texto irá ao plenário na próxima segunda-feira (8), após decorridos os três dias úteis de prazo da urgência,

Curitiba de Volta ao Centro

Ainda de iniciativa do prefeito, a CCJ aceitou o trâmite para criar o Programa Curitiba de Volta ao Centro (002.00024.2025). Trata-se de estabelecer as bases conceituais para ações e intervenções que promovam um desenvolvimento integrado da Região Central de Curitiba, por meio de instrumentos urbanísticos e da concessão de incentivos fiscais e construtivos. O projeto também segue para análise do colegiado de Economia.

O Programa Curitiba de Volta ao Centro visa à revitalização, à requalificação e à reocupação da Região Central da capital paranaense, com horizonte até 2050. A proposição integra habitação, segurança, mobilidade, cultura e desenvolvimento econômico. O projeto estabelece um robusto conjunto de incentivos fiscais (redução/isenção de IPTU, ISS e ITBI) e subvenções econômicas, com estimativa de R$ 163 milhões até 2032.

Outras proposições aprovadas

De autoria dos vereadores, as proposições analisadas pela Comissão de Constituição e Justiça também tiveram seu trâmite aprovado com os seguintes objetivos:

- Declarar de Utilidade Pública o Instituto RIC (014.00055.2025), de Jasson Goulart (Republicanos), que segue para a Comissão de Saúde e Bem-Estar Social;

- Instituir ações de conscientização sobre a responsabilidade diferenciada de veículos de maior porte em relação aos de menor porte, bem como em relação a pedestres e ciclistas, com foco na redução da letalidade no trânsito (005.00590.2025, com substitutivo geral 031.00268.2025), de Delegada Tathiana Guzella (União), que segue para a Comissão de Educação, Turismo, Cultura, Esporte e Lazer;

- Estabelecer a tarifa temporal familiar no sistema de transporte coletivo (005.00440.2025), de Fernando Klinger (PL), que segue para o colegiado de Economia;

- Conceder o título de Vulto Emérito de Curitiba a Ciro Possobom (116.00007.2025), de João da 5 Irmãos (MDB), que segue para a Comissão de Educação;

- Criar o Polo Gastronômico Francisco Derosso (005.00694.2025), de Jasson Goulart (Republicanos) e Lórens Nogueira (PP), que vai para a pauta da Comissão de Urbanismo, Obras Públicas e TI;

- Priorizar obras de acessibilidade financiadas pelo Funrecal (Fundo de Recuperação de Calçadas) (005.00415.2025), de Laís Leão (PDT) e Pier Petruzziello (PP), que vai para análise da Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização;

- Declarar de Utilidade Pública o Grupo Folclórico Ucraniano Poltava (014.00004.2025), de Pier Petruzziello e Rodrigo Marcial (Novo), que integra a pauta da Comissão de Saúde e Bem-Estar Social;

- Declarar de Utilidade Pública o Instituto Nobis (014.00086.2025), de Indiara Barbosa (Novo), que agora está na pauta da Comissão de Saúde e Bem-Estar Social; e

- Criar o Cadastro Único para Pessoas em Situação de Rua (005.00191.2025, com substitutivo geral mais recente 031.00289.2025), de João Bettega (União), que agora está com a Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização.

Proposições arquivadas

Um conjunto de 7 proposições legislativas foi arquivado pelos membros da CCJ da Câmara de Curitiba. O arquivamento se dá quando o colegiado entende que não há condições legais de aquela iniciativa prosperar. Na 33ª reunião da CCJ, foram arquivados os projetos de lei que visavam a:

- Estabelecer diretrizes sobre informações de glúten e lactose em alimentos vendidos para consumo imediato (005.00682.2025), de Delegada Tathiana Guzella (União);

- Instituir a Política Municipal de Saúde Integral das Mulheres em Curitiba (005.00628.2025 ), da Professora Angela (PSOL),

- Dispor sobre diretrizes para atenção à saúde de pessoas com vitiligo e psoríase. (005.00559.2025 , com substitutivo geral 031.00222.2025), de Camilla Gonda (PSB);

- Autorizar implantação de vagas de embarque e desembarque em serviços de saúde e revitalização de passeios públicos (005.00693.2025), de Eder Borges (PL);

- Instituir o chamado IPTU Verde (002.00003.2025), de Giorgia Prates – Mandata Preta (PT);

- Instituir licença por sintomas graves associados ao fluxo menstrual (005.00674.2025), de Professora Angela; e

- Instituir o Dia do Cão Idoso em 1º de outubro (005.00675.2025), de Andressa Bianchessi (União).

O que acontece com os projetos arquivados?

Com a decisão de arquivamento pela CCJ, projetos semelhantes só poderão ser apresentados novamente na próxima sessão legislativa (ano seguinte). É possível, no entanto, desarquivar uma proposição, exigindo mobilização política e votação em Plenário. Para isso, os autores da proposta têm um prazo de cinco dias úteis para reunir o apoio de, no mínimo, um terço dos vereadores (o equivalente a 13 assinaturas). Com as assinaturas coletadas, o parecer da CCJ é levado à votação única no Plenário. A decisão dos vereadores, neste ponto, é crucial: se o parecer pelo arquivamento for aprovado, a proposição é encerrada de forma definitiva. Contudo, se o parecer for rejeitado, o projeto é desarquivado e imediatamente retorna às comissões permanentes para uma nova análise e manifestação sobre o mérito.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da
CMC é atualmente presidida por Fernando Klinger (PL), tendo Tiago Zeglin (MDB) como vice-presidente. Além deles, integram o colegiado os seguintes vereadores: Camilla Gonda (PSB), Da Costa (União), Jasson Goulart (Republicanos), Lórens Nogueira (PP), Rafaela Lupion (PSD), Rodrigo Marcial (Novo) e Toninho da Farmácia (PSD). Os trabalhos e as reuniões da CCJ podem ser acompanhados ao vivo pelo canal oficial da Câmara Municipal de Curitiba no YouTube.

*Notícia revisada pelo estudante de Letras Gabriel Kummer
Supervisão do estágio: Ricardo Marques