Felicidade deve orientar políticas públicas, sugere especialista

por José Lázaro Jr. | Revisão: Gabriel Kummer* — publicado 26/11/2025 12h55, última modificação 27/11/2025 11h26
CEO da Wholebeing Institute, Henrique Bueno defendeu o uso de indicadores de bem-estar em decisões sobre políticas públicas em Curitiba.
Felicidade deve orientar políticas públicas, sugere especialista

9,3% dos brasileiros sofre de ansiedade, alertou Henrique Bueno, na Tribuna Livre da Câmara de Curitiba. (Fotos: Carlos Costa/CMC)

Indivíduos mais felizes têm menos risco de depressão, vivem mais e produzem melhor”, afirmou Henrique Bueno, na Tribuna Livre da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) nesta quarta-feira (26), ao apresentar evidências científicas que defendem a adoção da felicidade como indicador de qualidade em políticas públicas. O debate foi proposto por Indiara Barbosa (Novo) e Nori Seto (PP), com transmissão ao vivo pelo canal da CMC no YouTube (076.00039.2025).

Henrique Bueno, que é mestre em Psicologia Positiva pela University of East London e CEO global do Wholebeing Institute, foi convidado para participar da Tribuna Livre, com o tema “Cidade Feliz – Felicidade se Aprende”. Ele destacou a relevância do tema para o planejamento urbano, a saúde mental e o desenvolvimento humano, no contexto da revisão do Plano Diretor. “Eu resolvi mergulhar no estudo científico das condições que fazem a vida valer a pena, porque percebi que sucesso externo não garante bem-estar interno”, disse.

Crise de saúde mental e evidências científicas

Durante a exposição, Bueno apresentou dados que classificou como alarmantes para compreender o cenário da saúde mental no Brasil. Ele citou que o país lidera o ranking global de ansiedade, com 9,3% da população afetada, e registra crescimento simultâneo de depressão, burnout e suicídios. Destacou que uma vida mais feliz não se limita à ausência de doença, mas à combinação entre prazer e sentido, conjunto que sustenta saúde emocional, produtividade e longevidade.

O especialista também apresentou estudos que associam felicidade a ganhos objetivos em políticas públicas. Segundo ele, indivíduos mais felizes têm entre 7 e 10 anos adicionais de expectativa de vida, 35% menos risco de depressão e até 20% mais imunidade. Bueno declarou que tais evidências justificam a adoção de métricas como a Felicidade Interna Bruta (FIB), criada no Butão, e índices usados pela ONU e pela Gallup, capazes de orientar governança, recursos públicos e desenho urbano com maior precisão.

Desigualdade, cidade e bem-estar coletivo

A vereadora Professora Angela (PSOL) questionou como integrar desigualdade territorial, mobilidade, serviços públicos e condições de trabalho ao debate. Bueno respondeu que felicidade não pode ser dissociada da realidade concreta das cidades. Afirmou que viver em insegurança, falta de acesso ou precarização limita o bem-estar, e que políticas públicas precisam ser estruturais. “Felicidade não é um lugar mágico onde tudo funciona; é viver aqui, no meio dos conflitos que a gente vive”, disse.

Segundo o pesquisador, políticas de mobilidade eficiente, segurança, educação inclusiva e espaços públicos qualificam o bem-estar coletivo. Ele defendeu a “sabedoria do E”: melhorar infraestrutura e estimular escolhas individuais saudáveis são ações complementares, não excludentes. Para Bueno, cidades que ampliam o tempo livre, reduzem deslocamentos e fortalecem vínculos comunitários criam condições reais para que a população exerça sua liberdade de forma mais equilibrada e sustentável.

Famílias, telas e desafios da juventude

Ao responder às perguntas da vereadora Delegada Tathiana Guzella (União), de Meri Martins (Republicanos) e de Eder Borges (PL), Bueno destacou que crianças e adolescentes passam em média 9,8 horas por dia conectados, o que prejudica o foco, a convivência social e a estabilidade emocional. Ele explicou fenômenos como a adaptação hedônica — a rápida perda de impacto das conquistas — e a hiperbusca de dopamina impulsionada por telas, que substitui experiências com sentido por estímulos instantâneos.

Para famílias, o especialista listou medidas práticas: limitar o uso de celulares principalmente à noite, fortalecer rituais de convivência presencial, brincar com crianças sem mediação de telas e cultivar gratidão em experiências reais, e não como expressão superficial. Segundo ele, hábitos cotidianos moldam bem-estar mais efetivamente do que grandes mudanças. “Não há felicidade sem práticas felizes todos os dias”, afirmou, ao defender ações graduais e acessíveis para todas as faixas etárias.

Educação positiva e desempenho acadêmico

Instigado por Marcos Vieira (PDT) e Meri Martins, Bueno apresentou resultados de pesquisas realizadas no Butão, na Inglaterra, no México e nos EUA, mostrando que programas de educação positiva — ensino sistemático de competências socioemocionais e ciência do bem-estar — produzem efeitos mensuráveis. Escolas que adotam essas práticas registram queda em faltas, melhora no clima escolar e aumento do engajamento comunitário, mesmo em contextos de vulnerabilidade social.

Ele destacou que, ao contrário do que se supunha, incluir bem-estar na carga horária não reduz o desempenho acadêmico. “Quando alunos e professores aprendem sobre bem-estar, as notas sobem — mesmo com menos tempo de aula tradicional”, afirmou. Segundo Bueno, ensinar propósito, autoconsciência e regulação emocional fortalece a capacidade de aprendizagem, amplia motivação e cria ambientes mais saudáveis, tanto para estudantes quanto para profissionais da educação.

Plano Diretor e cidades que promovem bem-estar

Respondendo a Indiara Barbosa (Novo), Bueno afirmou que Curitiba já se destaca no país pela infraestrutura urbana, pela mobilidade e por indicadores de bem-estar, mas pode avançar ao incorporar métricas de felicidade no processo de revisão do Plano Diretor. Ele defendeu que espaços públicos de convivência, segurança urbana, mobilidade acessível e políticas de longo prazo compõem o alicerce para cidades mais humanas e resilientes.

Bueno reforçou que cidades que integram dados, ciência e indicadores de bem-estar conseguem orientar decisões de forma mais precisa e responsável. Para ele, Curitiba tem potencial para ser referência nacional na aplicação desse modelo, especialmente se combinar políticas estruturantes com programas de educação positiva e ações comunitárias. “Curitiba pode avançar criando espaços onde a educação para o bem-estar também aconteça”, sintetizou.

A sessão foi encerrada por Leonidas Dias (Pode), que solicitou ao convidado uma definição final de felicidade. Bueno respondeu que felicidade é “a combinação de prazer e sentido, construída no cotidiano e ampliada por políticas públicas que favorecem escolhas saudáveis e relações humanas mais fortes”. Ao final, o CEO do Wholebeing Institute recebeu certificado de participação ao lado de Indiara Barbosa e Nori Seto.

*Notícia revisada pelo estudante de Letras Gabriel Kummer
Supervisão do estágio: Ricardo Marques