Teatro no Palácio Rio Branco insere a Câmara em tradição natalina

por João Cândido Martins | Revisão: Filipi Oliveira — publicado 09/12/2019 05h25, última modificação 06/05/2022 15h57
Teatro no Palácio Rio Branco insere a Câmara em tradição natalina

Apresentação no Palácio Rio Branco insere a Câmara de Curitiba na tradição natalina curitibana. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

Quem esteve na última terça-feira (3) em frente ao Palácio Rio Branco pôde assistir a apresentação de dois autos natalinos: A Anunciação do Anjo Gabriel e o Auto do Nascimento: O Sentido do Natal. A iniciativa foi um pedido do presidente da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), Sabino Picolo (DEM), ao prefeito Rafael Greca. A apresentação, que faz parte da programação da Prefeitura Natal de Curitiba - Luz dos Pinhais 2019, é uma consequência do projeto de revitalização da praça Eufrásio Correia, uma das metas de Picolo ao assumir a gestão do Legislativo.

Após a estreia dos autos de Natal, Sabino Picolo disse que sentiu seu coração “bater como o de uma criança” e agradeceu ao prefeito, aos demais vereadores e à população. “Parabéns aos artistas, parabéns aos vereadores que proporcionaram condições para que a cidade voltasse a sorrir, parabéns ao prefeito Rafael Greca por devolver Curitiba às famílias curitibanas”, disse. Ele lembrou a diferença depois da revitalização da praça Eufrásio Correia. “Hoje ela é transitável pelas famílias que podem desfrutar desse espaço histórico da cidade”, afirmou.

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Trechinho da apresentação transmitida ao vivo pelo Facebook da CMC

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Neste ano de 2019 a prefeitura de Curitiba está promovendo mais de 130 eventos natalinos em diversos locais da cidade, como o Passeio Público, a praça Santos Andrade e as Regionais. É a primeira vez que a Câmara Municipal de Curitiba integra esses eventos. A presidente da Fundação Cultural de Curitiba (FCC), Ana Cristina de Castro, destacou que “os autos de Natal nas escadarias da Câmara Municipal marcam um momento muito especial que emocionou a todos os presentes. Levar a arte e a cultura nos mais diversos locais da cidade é a missão da instituição”.



Segundo Edson Bueno, diretor artístico do Natal de Curitiba, o texto que originou o auto foi uma construção coletiva. “Ele foi elaborado por várias cabeças. Até o prefeito Greca colocou sua criatividade nele, mas o texto não tem um dono”. A história do menino Jesus é contada em rimas pelos pastores. Eles anunciam a entrada de Nossa Senhora, de São José, do anjo Gabriel e dos outros personagens.

A apresentação de dois autos conta a história do nascimento de Jesus, com as personagens ocupando as escadarias do Palácio Rio Branco, trajando roupas coloridas e cantando em rimas e prosa. A mensagem é de fé, alegria e esperança. O Auto de Natal foi apresentado nas regionais, mas na Câmara ele foi acrescido de um número musical cantado pelos anjos.

“A receptividade do público tem sido grande”, diz Bueno, “mas na Câmara Municipal foi especial, principalmente em função da beleza do cenário”. Ainda de acordo com o diretor artístico do Natal de Curitiba, os atores que encenaram o auto foram contratados pela Fundação Cultural de Curitiba. Os autos de natal que foram apresentados nas escadarias do Palácio Rio Branco se inserem numa tradição natalina curitibana que remonta ao final do século XIX.

Curitiba natalina
A comunidade Antigamente em Curitiba do Facebook, organizada pelo empresário e pesquisador Paulo José da Costa, reúne fotos antigas da cidade. Nela, é possível encontrar amostras de como foram alguns natais curitibanos antigos. É de 1888 o registro da primeira árvore de Natal em Curitiba (foto 2). De acordo com a historiadora e professora Cassiana Lacerda, citando o jornal Galleria Illustrada daquele ano, "os alemães foram os introdutores da árvore de Natal em nossa sociedade, que, até então, se limitava às suas ‘soirées’, a festivais e à devoção da Missa do Galo".

Em 1891, os imigrantes italianos estabelecidos em Santa Felicidade escolheram a data para inaugurar sua nova igreja. Na noite do dia 24, houve uma procissão com mais de duas mil pessoas, todas segurando velas. É o que conta o padre Pietro Colbacchini, construtor do prédio, em cartas enviadas para seus superiores em Roma. A festa se difundiu entre as famílias, como se pode observar em uma foto de 1925, que retrata o natal na Casa Hoffmann (foto 4). Segundo a professora Cassiana Lacerda, aparecem na foto Hilário Hoffmann (Römerstad, 1833 - Curitiba, 1925) e seu filho Júlio Hoffmann (Römerstad, 1875 - Curitiba, 1956).

Em 1928, os irmãos Sobania resolveram aumentar a venda de suas balas e, para isso, passaram a vendê-las acompanhadas por figurinhas com imagens de um palhaço chamado Zequinha. As figuras traziam Zequinha nas mais diversas situações (bombeiro, médico, policial, etc). Nos vinte anos seguintes as balas Zequinha foram uma febre entre as crianças de Curitiba. A foto 5 mostra a figura 99, desenhada por Paulo Carlos Rohrbach (funcionário da Impressora Paranaense de 1939 a 1953) que representa Zequinha como Papai Noel. Rohrbach também desenhou o rótulo da Gasosa Cini. 

Outra proposta natalina que marcou época na cidade partiu da extinta loja Hermes Macedo, que entre 1940 e 1990 se vestia para o Natal. A empresa instalou, na rua Barão do Rio Branco, um arco que unia as duas calçadas com inscrições e imagens referentes ao Natal. Tinha a Gruta Encantada, desfile com carros alegóricos e os funcionários se fantasiavam para receber o Papai Noel. É possível encontrar na internet muitas imagens do arco instalado pela HM ao longo dos anos. A foto 6, por exemplo, é da década de 50, e a foto 7 mostra o mesmo local já na década de 70.

Dois dos maiores escritores paranaenses, Dalton Trevisan e Paulo Leminski, se dedicaram ao Natal em algum momento de suas carreiras. Em 1984, Leminski lançou pela editora Brasiliense o livro “Jesus”, no qual explica com sua erudição a trajetória do personagem bíblico (foto 8). Sobre o nascimento de Cristo, ele comenta que: “As tradições apostólicas e os relatos evangélicos cercaram seu nascimento e primeiros anos de toda sorte de lendas das mil e uma noites, de que o Oriente gosta. Desde o nascimento de uma virgem até a visita de três Magos ao menino recém-nascido, cada um portando presentes, ouro, incenso e mirra. As contradições entre uma história verdadeira e lendas e fábulas que se teceram em volta de Joshua (Jesus) aparecem à primeira vista”.

Dalton Trevisan, por sua vez, propôs um conto passado na noite de Natal. O título é Onde estão os natais de antanho?, publicado no livro “Desastres do Amor” (Editora Record, 1993). Sua visão do natal não é colorida. Envolve o erotismo e o senso de brutalidade que caracterizam sua obra, cujos enredos sempre se passam numa Curitiba sombria e pecaminosa. Dalton é por muitos considerado o maior contista vivo do Brasil.

Nos anos 90, a decoração do Palácio Avenida na Rua XV também entrou para a história da cidade. Originalmente produzida pelo extinto Banco Bamerindus, a festividade reunia um coro de crianças nas janelas e portas da construção histórica (veja uma propaganda de 1991). O evento passou por transformações, mas até hoje encanta a população e os turistas que lotam a avenida Luiz Xavier para assistir o espetáculo (foto 9). Também na década de 90, o Centro Comercial Itália (Shopping Itália) passou a decorar o prédio durante o Natal. Por ser um dos edifícios mais altos da cidade, a decoração era visível a quilômetros de distância (foto 10).

Mais recente promovida pela prefeitura de Curitiba foi a Galeria de Luz, uma sequência de arcos e portais na rua XV com 50 mil lâmpadas coloridas (foto 11). A galeria foi elaborada pelo artista italiano Valerio Festi, responsável por decorações como a do aniversário do terremoto de Kobe, no Japão, e as arquiteturas de luz das Galeries Lafayette, em Paris. Na foto 12, a galeria instalada na rua XV em 2011.