Na Tribuna Livre, pesquisador defende o uso econômico da araucária

por João Cândido Martins | Revisão: Alex Gruba — publicado 13/04/2023 15h45, última modificação 13/04/2023 15h49
Professor da UFPR, Flávio Zanette expôs as características e as possibilidades econômicas da planta símbolo de Curitiba.
Na Tribuna Livre, pesquisador defende o uso econômico da araucária

Zanette defende uma lei municipal atualizada sobre a araucária (Foto: Carlos Costa/CMC)

Na Tribuna Livre da Câmara Municipal de Curitiba desta quarta-feira (12), o professor e pesquisador Flávio Zanette, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), discorreu acerca da repercussão mundial dos estudos recentes da Araucaria angustifolia, planta popularmente conhecida como araucária ou pinheiro-do-paraná. “Ele está aqui para nos falar dos frutos dessas pesquisas e nos ajudar a pensar uma política pública para as araucárias em nossa cidade”, disse o vereador Hernani (PSB), autor do convite. A Tribuna Livre é o momento dento da sessões ordinárias da Câmara em que especialistas em temas de interesse coletivo, comparecem para expor esclarecimentos e demandas.

Zanette possui um vasto currículo: é graduado em Engenharia Agronômica na UFPR, especializado em Agricultura Tropical pela Universidade de Firenze, na Itália, e mestre e doutor em Fitotcnia e pós-doutorado pela Escola Superior de Rennes, na França. Ele disse que seu objetivo foi trazer conhecimentos sobre as características da planta, propor uma discussão sobre a legislação em vigor e propor ideias para a elaboração de uma política pública municipal sobre o tema, baseada em critérios ambientais, sociais e econômicos.

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Araucária não é uma árvore

Um grande avanço, segundo o pesquisador, foi a aprovação, na Assembleia Legislativa, da lei estadual 20.223/2020, que incentiva o plantio sustentável da araucária com fins comerciais. “Essa nova lei, que é muito positiva, está em fase de regulamentação. Ela representa um progresso no entendimento e no uso dessa planta, mas sempre houve muita desinformação sobre o assunto. Quanta pessoas sabem, por exemplo, que a araucária não é uma árvore? Pouquíssimas pessoas sabem disso. Na verdade, ela é uma planta intermediária entre a palmeira e a árvore”, afirmou o professor.

Ele contou que seu interesse na araucária surgiu quando estudava na França. De acordo com ele, os pesquisadores europeus consideram a araucária umas das plantas mais importantes da América do Sul. “O que houve ao longo do século XX foi uma verdadeira devastação das florestas de araucárias, sem o necessário replantio posterior, acompanhado do devido manejo técnico da planta”, disse o pesquisador. “Em 1985, conseguimos a primeira planta de laboratório, a primeira planta de proveta”, ressaltou, sendo ele reconhecido como criador de uma técnica de clonagem com ciclo de crescimento acelerado e alta produtividade.

Necessidade de cortes e sombras

De acordo com Zanette, a antiga legislação referente às araucárias era excessivamente protetiva, o que ocasionava prejuízos ao próprio replantio. Ele apontou situações presentes na legislação anterior, que mostram como algumas vezes a boa vontade, quando não aliada ao conhecimento, pode ser prejudicial. “Proibir totalmente o corte impede que novas araucárias surjam dentro das florestas já existentes, pois a araucária nova não cresce em um ambiente de sombra, ela precisa da luz solar pra se desenvolver. É necessário cortar algumas árvores da floresta, criando faixas que possibilitem o crescimento de novas araucárias. Na sombra, não ocorre regeneração. Uma muda de araucária sem exposição à luz do sol não chega a crescer mais do que um palmo”, disse o pesquisador. 

Ele explicou que a araucária obedece a uma técnica de plantio conhecida como enxertia, na qual a muda é inserida em um espaço quadrado com medidas específicas. “Sem essa técnica, a planta não cresce”, disse. O pesquisador esclareceu que o pinheiro nunca foi uma árvore urbana e que precisa ser manejado para não oferecer riscos às pessoas que transitam ou moram no seu entorno. “Vamos acabar com a agonia das pessoas que se sentem ameaçadas pela presença de pinheiros ao lado de suas residências. Araucárias nunca foram árvores urbanas”, afirmou.

Comissão para derrubar pinheiros

“Fui convidado pelo prefeito Rafael Greca para compor uma comissão que decidiria quais pinheiros deveriam ser derrubados em Curitiba. Houve um grupo interno que pressionou pela saída do Clóvis Bôsco, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), pois consideraram que ele era muito rígido. Depois, pressionaram pela minha saída. Nem sei se o prefeito está sabendo. E isso se deveu ao fato de que eu defendia a manutenção dos pinheiros que tivessem pelo menos sete galhos”, disse Zanette.

“Quando os pinheiros atingem uma certa altura, sem o número de galhos suficientes, oferecem claro risco. Sete galhos são a garantia de que a planta vai crescer com equilíbrio”, ressaltou Zanetti. Ele mostrou imagens de araucárias altas, mas com poucos galhos, ao lado de edificações de um condomínio em Curitiba. “Eu peço aos vereadores que assumam a arborização da cidade, que assumam, por lei, o manejo da Araucaria angustifolia em Curitiba”, defendeu o professor da UFPR.

Perguntas dos vereadores

Em resposta a Rodrigo Reis (União), Flávio Zanette disse que a ave gralha-azul, que era conhecida por disseminar as sementes de pinheiros, já não consegue realizar esse procedimento natural por causa do desmatamento. “Virou mito. Antigamente, era assim, mas a devastação praticamente acabou com isso”. Indiara Barbosa (Novo) indagou sobre o aproveitamento da madeira da araucária. Zanette respondeu que a prefeitura recebe uma quantidade expressiva de toras de madeira a título de doação: “Muitas pessoas só querem se livrar do volume. Acho que poderia haver uma licitação para escolher uma empresa madeireira que desdobrasse essas toras, visando a construção de casas populares.”

Herivelto Oliveira (Cidadania) perguntou se é possível manipular geneticamente o pinheiro para que os galhos que se sobressaem quando a planta é mais antiga não representem ameaça. Zanette disse que seus experimentos não são de natureza genética, mas que, por meio da clonagem, todas as alterações são possíveis. Professora Josete (PT) perguntou em que fase do crescimento da araucária é possível o aproveitamento econômico e se já existem áreas de replantio determinadas com base na nova lei estadual. De acordo com Zanette, com 25 anos de crescimento, a madeira da araucária é de primeira. Quanto às áreas de replantio, ele disse que isso depende da regulamentação vigente.

Marcos Vieira (PDT) perguntou onde sé possível conseguir mudas. De acordo com Zanette, em Porto Amazonas há um viveiro que tem autorização para fornecer, sendo que em determinadas épocas do ano é necessário encomendar. “Eu que produzo no quintal da minha casa”, revelou. Em resposta a Amália Tortato (Novo), Zanette reiterou a necessidade de uma legislação municipal específica sobre as araucárias. “Se os vereadores de Curitiba desenvolverem uma legislação adequada e uma política pública de atendimento às necessidades da planta, vão verificar que os resultados são significativos”, finalizou.