ICI recebe críticas em palestra sobre marco regulatório das organizações sociais

por Assessoria Comunicação publicado 11/11/2016 17h35, última modificação 13/10/2021 07h22

Para reforçar que as organizações sociais (OS) precisam dar publicidade de seus gastos, palestrante citou, na tarde desta sexta-feira (11) na Câmara Municipal, exemplo do serviço ofertado pelo Instituto Curitiba de Informática e acusou a entidade de não ser transparente na prestação de informações à população. Professor do Núcleo de Pesquisa em Direito do Terceiro Setor da Universidade Federal do Paraná, Tarso Cabral Violin fez críticas às mudanças realizadas no Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC, lei 13.019) pela lei 13.204/2015.  Ele foi um dos oradores do curso promovido pela Escola do Legislativo sobre o tema.

“Entidade privada que não recebe dinheiro público tem independência maior para atuar, mas se receber, vai ter que atender certos requisitos, como moralidade, transparência, eficiência, legalidade e publicidade. No caso das OS, é um desrespeito o que acontece. O ICI aqui em Curitiba, que é o nosso modelo das OS, recebe milhões da prefeitura sem licitação, só que não é ele que presta esse serviço, ele contrata empresas para prestar esse serviço. O prefeito atual, até pouco tempo atrás, não sabia para quais empresas esse dinheiro ia. Imagine então a gente, cidadão”, lamentou.

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Segundo ele, o tema sobre a regulamentação da contratação, pelo poder público, de organizações  sociais, ocorre no Brasil desde 1997. “O termo terceiro setor surge forte na década de 90. O neoliberalismo gerencial basicamente defendia que as atividades sociais do estado, como educação, saúde, assistência social, cultura, e tudo aquilo que o estado executasse diretamente teria que ser repassado para entidades do terceiro setor. Repassar para as organizações sociais, as famosas OS”, recordou.

Em Curitiba, conta ele, “não foi diferente”, mas após diversos debates inclusive na Câmara Municipal, a contratação das OS seria restringida, principalmente proibindo seu uso na educação e na saúde. “A lei das OS [municipal], foi criada para que toda a parte de informática fosse repassada para uma entidade privada, sem fins lucrativos. Foi sem licitação, para que a entidade não precisasse fazer, por exemplo, concurso. E é aí que surge o ICI. A lei das OS serviu para privatizar em Curitiba a parte de informática, tecnologia e comunicação. Hoje  o prefeito que se elegeu [Rafael Grega] é bastante crítico nessa questão de privatização da informática e esse ponto acabou sendo bastante debatido nas eleições”, recordou.

Tarso criticou o modelo “neoliberal” criado na década de 1990. “Eu questiono por vários motivos jurídicos, legais e constitucionais. A figura das OS eu questiono frontalmente porque um prefeito, ou governador que não quer realizar concurso para contratar professor, médico, repassa a gestão daquela instituição estatal para uma entidade sem fins lucrativos, celebrando contratos com essa entidade. Isso fere a obrigatoriedade de licitação, concurso, controle. É um modelo inconstitucional.” Ele apontou que vários tribunais de contas já concluíram que é um formato mais caro, “os dirigentes acabam recebendo mais e os médicos e outros profissionais contratados, menos”.

Mrosc
Para Tarso, o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (lei 13.019 modificada pela lei 13.204/2015) não supre todas as necessidades de fomento no país. Ele acredita que a lei não resolveu no sentido de simplificar, de reunir as várias legislações anteriormente existentes sobre o assunto, e em algumas vezes até “complicou”. “Uma das coisas que trata essa lei é basicamente o fomento, a união de esforços da administração pública com a sociedade civil organizada nas mais variadas áreas e tudo era  realizado por meio de convênios. Agora não. Tem termo de colaboração, termo de fomento e o acordo de colaboração quando não tiver repasse de recurso. Pra mim isso é mais pra complicar. Deveria ser tudo convênio. Não precisaria chamar acordos parecidos, com três nomes diferentes”, concluiu.

O grande problema da alteração promovida pela lei 13.204/2015, alertou ele, foram as mudanças relativas ao chamamento público. “O Marco regulatório dizia que o chamamento público era a regra, mas essa lei de 2015 transformou isso em exceção e não regra. O que era uma vitória [do marco aprovado em 2014], de incluir como regra o chamamento público para moralizar o repasse de dinheiro público, com o mínimo de barreiras, como publicidade e legalidade, a partir de 2015 vai passar a ser uma exceção. E isso vai passar a valer para os municípios a partir de 2017 e para os estados agora em 2016.” Segundo ele, o que tinha sido regulamentado de forma adequada em 2014, por lobby de grandes Ongs, sofreu um retrocesso em 2015. “Hoje é só se cadastrar e pronto, está liberado para o governador, prefeito, vereadores escolherem a entidade que bem entenderem, sem passar pelo chamamento público”, advertiu.

A diminuição do tempo de experiência das Ongs, que se exigia inicialmente na lei em 2014, também foi criticada. “Eram exigidos três anos de experiência e acho que era algo razoável. Acho bastante perigoso criar entidades especialmente para uma situação, sem que tenham uma experiencia na área. A partir [da mudança] de 2015 a lei prevê um ano [de experiência] para municípios, dois para estados e três só para a União. Para mim é pouco [tempo para] o município poder contratar uma entidade que acabou de ser criada para receber dinheiro público.”

Transparência
Durante a manhã desta sexta-feira, o advogado Fernando Borges Mânica, da Universidade Positivo (UP), falou sobre chamamentos públicos e procedimentos de manifestação interesse social. A palestra fez parte das atividades realizadas no auditório do Anexo II da Câmara de Curitiba que iniciaram ontem.

Mânica salientou a criação do Marco Regulatório como um avanço na legislação, na medida em que reuniu diversos itens em uma única lei, no intuito de dar segurança jurídica e o máximo detalhamento sobre a regulamentação das parcerias entre o poder público e as organizações não governamentais. “Mas por ser uma lei muito ampla, acaba trazendo muitos limites, porque é impossível prever todos os casos. Por isso, um ano e meio depois, houve 400 alterações nela”, ponderou.

No entanto, o jurista salientou o Marco Regulatório como um avanço ao trazer regulamentação específica na celebração de parcerias entre organizações da sociedade civil e o poder público, pela qual se exige mais transparência e possibilita a participação popular.

“Antes os convênios surgiam "do nada". Mas agora a população pode levar até a administração as demandas de uma parceria, as especificidades, as sugestões. Hoje existe planejamento, se estabelecem objetivos. A partir daí é que se abre o processo para seleção, celebração, execução, monitoramento, avaliação e prestação de contas do convênio”, explicou Mânica. Nesta sexta pela manhã, também houve palestra com o advogado Leandro Marins de Souza, com o tema “Aspectos fiscais”. Ouça na íntegra as palestras da manhã e da tarde.