Câmara de Curitiba aprova criação do Conselho Municipal da Diversidade Sexual

por José Lázaro Jr. | Revisão: Alex Gruba — publicado 13/02/2023 12h35, última modificação 13/02/2023 16h58
Projeto do Executivo foi votado em primeiro turno e depende da confirmação, nesta terça, para ir à sanção.
Câmara de Curitiba aprova criação do Conselho Municipal da Diversidade Sexual

Criação do Conselho da Diversidade Sexual teve 25 votos favoráveis na Câmara de Curitiba. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

A criação do Conselho Municipal da Diversidade Sexual (CMDS) foi aprovada, em primeiro turno, nesta segunda-feira (13), pelos vereadores da capital do Paraná. A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) registrou 25 votos favoráveis e 7 contrários, após quase três horas de discussão em plenário, que mobilizou 12 dos 38 parlamentares. Diversas entidades do movimento em defesa dos direitos humanos acompanharam a votação em plenário, assim como representantes da Defensoria Pública do Estado e da Ordem dos Advogados do Brasil.

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Encaminhada para a análise do Legislativo no fim de março de 2022, a proposta passou pela análise das comissões temáticas e desde outubro passado aguardava a inclusão na pauta (005.00064.2022). Foram aprovadas duas emendas, sendo uma da Federação PT-PV para não limitar as reeleições dos cinco conselheiros da sociedade civil (034.00004.2023) e outra, do Professor Euler (MDB), detalhando que as outras cinco vagas serão indicadas pela Prefeitura de Curitiba (034.00005.2023). O CMDS terá dez membros para fiscalizar e propor políticas públicas na área.

Na lista de atribuições específicas está a execução do Plano Municipal de Políticas da Diversidade Sexual (PMPDS), o assessoramento aos demais órgãos do Executivo, a organização da conferência municipal e a participação nas conferências estadual e nacional de Políticas da Diversidade Sexual, além do encaminhamento de denúncias. Segundo o projeto da Prefeitura de Curitiba, a proposta abrange a população LGBTQIA+, entendida como a formada por lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, queer, intersexuais, assexuais e pansexuais.

A Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), a Reitoria da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e o Núcleo de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça e Proteção aos Direitos Humanos do Ministério Público do Paraná (MP-PR) enviaram ofícios e notas técnicas à CMC, em apoio à criação do Conselho da Diversidade Sexual, que foram distribuídas no início da sessão plenária.

Votos favoráveis
“A criação do CMDS vinha sendo construída há bastante tempo pela secretaria do Governo, em conjunto com os movimentos sociais”, disse Pier Petruzziello (PP), líder do governo, que orientou a base a votar favoravelmente à proposta. “Não podemos viver numa terra repleta de ódio e intolerância. O conselho dará uma eficácia mais ampla às políticas públicas e [com ele] damos o recado que respeitamos a todos na nossa sociedade”, afirmou Petruzziello.

“Hoje é um dia de muita alegria. É muito importante essa iniciativa do prefeito Rafael Greca, que é uma solicitação de muito tempo dos movimentos, pois a população LGBTIQA+ é historicamente estigmatizada e vulnerável. 84% sofre discriminação nas ruas e 53,8% das pessoas LGBTQIA+ que moram na Grande Curitiba não são aceitas pelas suas famílias. Ela precisam ser acolhidas e respeitadas, ter atendimento adequado na Saúde e poder ir à escola”, disse a vereadora Professora Josete.

As agressões à população LGBTQIA+ foram citadas por Josete, Maria Letícia (PV), Giorgia Prates (PT) e Angelo Vanhoni (PT) durante o debate da proposta. Eles lembraram ao plenário que as pessoas cuja identidade de gênero escapa à heteronormatividade estão mais sujeitas a crimes de ódio, ao suicídio, ao desemprego e ao abandono familiar que outros grupos sociais, em razão do preconceito e da discriminação lgbtfóbica.

“A criação do conselho é um marco para a população LGBTI de Curitiba, mas a luta não vai terminar agora”, disse Giorgia Prates, da Mandata Preta. “Eu quero falar como uma mulher preta e lésbica, que cresceu sem essa escuta qualificada. A única escolha que eu pude realmente fazer foi ser eu mesma, diante de uma sociedade que tenta fazer a gente desistir de ser quem somos todos os dias. O CMDS é um projeto sonhado pelos movimentos sociais há 30 anos, resultado da luta dos que estão aqui e por muitos outros que morreram”, afirmou a parlamentar.

“Em 2011, veio o direito à união estável. O casamento civil se tornou possível em 2013 e o direito à adoção em 2015. A retificação do nome de do gênero foi conquistado em 2018, a criminalização da homofobia em 2019 e o direito à doação de sangue em 2020. A criação do Conselho Municipal da Diversidade Sexual é uma conquista que vamos colocar nessa lista. Querem nos calar, não conseguirão” acrescentou Maria Leticia. Ela agradeceu à presença em plenário do Grupo Dignidade, da Liga Brasileira das Lésbicas, do coletivo Mães Pela Diversidade, da Marcha Mundial das Mulheres, do Grupo Mami e do Coletivo Cássia, entre outras entidades.

“Nós, do movimento Livres, defendemos a liberdade por inteiro, mas se somos mais conhecidos pelas pautas econômicas, também defendemos a liberdade nos costumes. A  gente precisa reforçar o óbvio, que todas as formas de amor são bem-vindas”, disse Amália Tortato (Novo), parabenizando a Prefeitura de Curitiba pela criação. “Reduzir os preconceitos e garantir os direitos”, afirmou Bruno Pessuti (Pode), enquanto Serginho do Posto (União) enalteceu a importância do espaço para a legitimidade das políticas públicas nesta área.

“Quero cumprimentar o prefeito, pois não é uma causa de esquerda ou de direita, é uma causa humanitária que reafirma direitos fundamentais e princípios da Constituição Federal”, congratulou Dalton Borba (PDT), cujo correleginário, Marcos Vieira, reiterou que é dever da Câmara Municipal “defender uma cidade para todas as pessoas”. “Eu acredito que é um assunto de Estado, pois se parte significativa da população quer que sejam pensadas políticas públicas sobre esse tema, é uma questão de Estado”, corroborou Professor Euler (MDB). “Estamos vendo uma cidade que aponta outros caminhos, de mais acolhimento entre nós”, arrematou Vanhoni.

“Em 2018, fui coordenador da campanha do presidente Bolsonaro no Paraná. Houve uma discussão errada dessa questão em nível nacional, como se a população LGBT fosse de esquerda. Houve um erro da direita em não discutir com esses grupos, pois representam 10% da população e não podemos ignorar essa causa. Temos políticos de direita que são LGBT. Não adianta fazer que nem avestruz, enfiar a cabeça na terra e fazer de conta que não existem. Respeito todas as opiniões, mas não precisamos radicalizar”, disse Rodrigo Reis (União), descolando-se do grupo que foi contra a criação do CMDS.

Votos contrários
Primeiro a falar contra a criação do Conselho de Diversidade Sexual, Eder Borges (PP) argumentou que o tema não é assunto de Estado. O vereador atacou especialmente a realização de um feirão de emprego para a população LGBTQIA+, dizendo que isso gerava segregação social. “Nada fundamenta que o cidadão que paga impostos banque uma pauta ideológica”, disse o político, que relativizou os dados sobre suicídio, por exemplo, afirmando que sofreu bullying na escola por “ser muito magro”. “Já existe Secretaria de Direitos Humanos [na prefeitura], o conselho é redundante, é demagogia”, disse.

Ezequias Barros (PMB) mostrou-se da mesma opinião que Borges, sendo contra a colocação de recursos públicos nas pautas do movimento LGBTQIA+. “Estamos criando privilégios com recurso público. Quem será beneficiado? Serão dadas aulas nas escolas defendendo ideologia de gênero? O movimento LGBT pode entrar nas escolas para falar dos seus assuntos, mas a igreja está proibida. A igreja só está liberada para entrar nos presídios”, comentou o vereador, para quem “a Constituição Federal já nos dá condição de igualdade, mas nós vamos criando guetos”.

“Eu não tenho preconceito, tenho amigos homossexuais e lésbicas, porém, ouvindo algumas falas, que mostram como somos divididos, a minha maior preocupação com o conselho é o movimento [social de defesa dos direitos LGBTQIA+], e não as pessoas [individualmente]”, disse Osias Moraes (Republicanos). “Se o movimento fizer pelo conselho uma política que entre nas escolas, vão enfrentar resistência, porque nós vamos estar de olho”, afirmou o parlamentar. Além de Borges, Barros e Moraes, votaram contra o CMDS os vereadores João da 5 Irmãos (União), Noemia Rocha (MDB), Pastor Marciano Alves (Solidariedade) e Sargento Tânia Guerreiro (União).

O projeto retorna à pauta desta terça-feira (14) para votação em segundo turno e, se confirmada pela CMC, segue para sanção do prefeito e Rafael Greca e posterior publicação no Diário Oficial do Município.