Em audiência, IPMC é questionado sobre futuras mudanças na previdência de Curitiba

por José Lázaro Jr. — publicado 18/09/2021 00h30, última modificação 18/09/2021 00h30
Audiência pública sobre emenda à LOM não se deteve nos aspectos iniciais do Executivo. Vereadores e sindicatos insistiram em detalhes da lei que aprofundará as mudanças.
Em audiência, IPMC é questionado sobre futuras mudanças na previdência de Curitiba

Com a pandemia, as audiências da CMC são feitas por videoconferência. Na foto, Breno Lemos, presidente do IPMC. (Foto: Carlos Costa/CMC)

Marcada pelas dúvidas com as etapas seguintes à emenda à Lei Orgânica do Município (LOM) que aplicará a Reforma da Previdência no regime próprio do funcionalismo de Curitiba, a audiência pública (407.00031.2021), realizada nesta sexta-feira (17), por iniciativa dos vereadores Marcelo Fachinello (PSC) e Pier Petruzziello (PTB), foi uma oportunidade para a sociedade interagir com o  Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Curitiba (IPMC). A atividade foi transmitida ao vivo pelas redes sociais da Câmara Municipal de Curitiba (CMC).

A Prefeitura de Curitiba enviou ao Legislativo, no dia 24 de agosto, uma proposta de alteração da LOM alinhada às mudanças empreendidas pela Emenda Constitucional 103/2019 (leia mais). As alterações incidem sobre dois artigos da LOM, 91 e 94, tratando da idade mínima, da aposentadoria especial dos professores, da previdência complementar e da redução da isenção de contribuição dos beneficiários do IPMC que ganham acima do teto do INSS (001.00002.2021). Na audiência, Breno Pascualote Lemos, presidente do IPMC, tratou desses tópicos e respondeu a perguntas.

A intenção de Fachinello e Petruzziello era aprofundar o debate sobre esses tópicos, que constam no projeto de alteração da LOM, mas os participantes da audiência pública pediram que a CMC discuta simultaneamente as alterações que virão depois, já que a iniciativa do Executivo prevê que novas regras de aposentadoria e pensão serão enviadas posteriormente por projeto de lei complementar. Foi questionado o histórico do déficit atuarial de R$ 25 bilhões do IPMC e a regulamentação das aposentadorias especiais, por exemplo.

Substituição de regime
O presidente do IPMC, Breno Lemos, defendeu a substituição do atual regime previdenciário de repartição (quando a contribuição dos funcionários da ativa custeiam o pagamento dos beneficiários) para o de capitalização (quando as contribuições do servidor custeiam sua própria aposentadoria). Ele entende que a hipótese mais difundida na opinião pública, que contratando mais servidores concursados haveria a correção do déficit, “não resolve o problema estrutural que nós temos”.

“Em 31 de dezembro de 2020, tínhamos 46,4 mil segurados, dos quais 60% são servidores ativos e 40% são pessoas em benefício (aposentados ou pensionistas). Isso forma uma razão de dependência de 1,56. Essa razão é tratada por quem discute o tema, pois é preciso transitar de um regime de repartição para um novo regime, de capitalização”, informou Lemos. 

O presidente do IPMC apresentou contas que colocam o valor atual do benefício futuro na ordem de  R$ 25 bilhões. “É o valor total, em 31 de dezembro de 2020, de todos os benefícios de aposentadoria e pensão dos já aposentados e dos que irão se aposentar, assim  como das pensões que irão ocorrer. Uma estimativa de todo o passivo que teremos a honrar ao longo da existência do nosso plano”. Na ocasião, o ativo financeiro do órgão era de apenas R$ 1,8 bilhão.

“As despesas previdenciárias vêm aumentando, passando da ordem de R$ 300 milhões em 2009 para R$ 1,5 bilhão ao final deste ano. E se tomar os dados de projeção desse ano, vai ver que pode chegar a R$ 2,5 bilhões em 2030. A despesa não espera e eu preciso ter recursos para cobri-la ano a ano”, disse, mostrando que, para este ano, por ora a previsão é faltarem R$ 226,9 milhões - de uma folha estimada em R$ 1,5 bilhão. “Para fazer a transição da repartição para a capitalização, temos que passar por esse equacionamento e chegar lá em 2055 com patrimônio de R$ 4,6 bilhões”, completou, acrescentando que “ainda assim, vai permanecer um déficit de R$ 10 bilhões que o Município deverá administrar”.

Dúvidas sobre a reforma
À frente da audiência, Fachinello abriu a palavra ao advogado Ludimar Rafanhim, que desde 1988 acompanha as questões relacionadas ao IPMC, e por vários anos representou formalmente sindicatos do funcionalismo municipal. “Toda proposta de reformulação dificulta o acesso ao benefício e taxa os aposentados e pensionistas”, criticou, após rememorar situações em 1991, 1999, 2008 e 2017 que impactaram o atual déficit atuarial da instituição, mas que são, segundo ele, deixadas de lado no debate. “Peço que a comissão [da CMC] faça essa retrospectiva, pois quem vai pagar a conta são os servidores”, disse.

Professora Josete (PT) concordou com Rafanhim, que “em vários momentos o Município deixou de cumprir suas obrigações” e pediu nova audiência pública, com mais espaço às entidades  sindicais. Indiara Barbosa (Novo) elogiou a gestão Rafael Greca “por iniciar a reforma da previdência” e ponderou que “ser a favor da reforma da previdência não significa ser contra os servidores públicos, mas ter consciência da responsabilidade fiscal”. Maria Letícia  (PV) questionou o compromisso da gestão com o funcionalismo, já que nesta semana foi suspenso o reajuste dado ano passado ao funcionalismo, de 3,14%.

Carol Dartora (PT) tratou de posicionar-se a favor dos servidores, afirmando que “não são números, é a vida das pessoas” e que é preciso pensar o impacto das mudanças nas categorias sobrecarregadas. Denian Couto (Pode) disse não se sentir confortável em votar a emenda à LOM sem conhecer, simultaneamente, o teor da lei complementar que virá na sequência. “O debate precisa vir por completo, não podemos [decidir] sem o quadro inteiro”, afirmou. Dentre outras coisas, Marcelo Fachinello questionou se a pandemia impactou a proposta do Executivo e por que isso não foi enviado antes ao Legislativo.

Questionamentos dos sindicatos
Para Fernanda Amaral, do Sismmac, a Prefeitura de Curitiba optou por contratar funcionários por contratos precarizados e terceirizações, causando “o desmonte do regime próprio de previdência”, e “agora vem com aumento do tempo de serviço, da alíquota de contribuição e redução do valor do benefício”. Rejane Soldani, do Sigmuc, cobrou que o Executivo, no caso da Guarda Municipal, regulamente as aposentadorias especiais, pois obrigar esses profissionais a atuarem no sistema de segurança pública até os 65 anos seria “condená-los à morte”.

André Luiz, do Sismuc, reforçou o problema causado pela falta de reposição dos servidores públicos, pois além dos reflexos na previdência, “a comunidade que depende do serviço público é que sofre com isso, pois ele está mais precário e escasso. Patrícia Mendonça, do Sismec, que representa a enfermagem, descreveu as mudanças na previdência como “ataques dirigidos aos servidores” e que não sabe de onde eles “tirarão saúde para trabalhar”. Falando pela associação de aposentados da Prefeitura de Curitiba, Julieta Reis, ex-vereadora, mostrou-se preocupada com a redução da isenção dos beneficiários, em especial sobre aqueles que ganham remunerações mais baixas.

Na audiência, Breno Lemos , Breno Lemos rebateu algumas críticas, dizendo que vê “com muita humanidade” as questões relacionadas ao funcionalismo, que sabe que a previdência “não é algo fácil de se tocar”, mas que os resultados a longo prazo compensariam. “Eu sei da repercussão, mas devemos ser responsáveis. O déficit precisa ser administrável”, reiterou. Ele confirmou que haverá, na futura lei complementar, um dispositivo para as aposentadorias especiais, mas que os estudos ainda não estavam prontos para compartilhá-la já.

Para Fachinello, afirmou que a gestão é transparente e que “o momento de fazer [a reforma da previdência em Curitiba] é o do amadurecimento [da discussão], de até onde precisamos chegar”. “Evidente que a pandemia traz transtorno, mas ela não muda a realidade a longo prazo da instituição. O déficit já era expressivo e agora aumentou”, explicou.

Mudanças na LOM
A Prefeitura de Curitiba quer alterar os artigos 91 e 94 da LOM, atualizando seus termos, aplicando regras da EC 103/2019 e prevendo a regulamentação de detalhes dos benefícios em futuras leis complementares. No artigo 91, fixa as novas idades mínimas de 62 e 65, respectivamente, para homens e mulheres, com o redutor de cinco anos para professores, desde que comprovem “efetivo exercício das funções de magistério”.

No artigo 91 da LOM, o Executivo prevê que futura lei complementar detalhará “os requisitos e critérios de concessão de aposentadoria e pensão por morte, bem como regras de transição de aposentadoria”. Na nova redação, há a previsão que servidores com experiência em outros Poderes Públicos terão isso incorporado, para fins de aposentadoria, considerando os fatores do tempo de contribuição e do tempo de serviço.

Já no artigo 94, a nova redação detalha a atuação do Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Curitiba (IPMC) e incluí, na LOM, a figura do Regime de Previdência Complementar - criado com o Plano de Recuperação de Curitiba, em 2017 (leia mais). Como no item anterior, é delegada a leis complementares posteriores como passará a ser paga a pensão a dependentes e os termos da contribuição previdenciária de servidores e segurados.

É neste item que o Executivo estabelece as bases para mudar a contribuição previdenciária recolhida por aposentados e pensionistas. Diz o projeto: “verificada a existência de déficit atuarial, a contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas poderá incidir sobre a integralidade do valor dos proventos de aposentadoria e pensões por morte, garantida a isenção de contribuição sobre, ao menos, o valor correspondente a um salário-mínimo, na forma do que for disposto em lei complementar”.

Em notícia publicada pela Prefeitura de Curitiba, o Executivo explica que “atualmente, os beneficiários contribuem a partir do valor de R$ 6.433,59 (teto do Regime Geral da Previdência Social em 2021). A proposta possibilita a contribuição sobre o valor dos proventos de aposentadoria e pensão por morte que exceder o equivalente ao salário mínimo (R$ 1.100)”.

Emenda à LOM
A Lei Orgânica do Município, que é uma espécie de constituição municipal, só pode ser alterada em três situações: por sugestão do prefeito, por proposição avalizada por um terço dos vereadores (13 parlamentares) ou por iniciativa assinada por 5% do eleitorado (60 mil pessoas aproximadamente). Por ser um evento especial, que modifica a norma mais importante da cidade, a sugestão precisa ser publicada no Diário da Câmara de Curitiba e em jornal de grande circulação.

A emenda à Lei Orgânica não tramitará pelas comissões permanentes do Legislativo. Em vez disso, será formado um grupo especial, composto por nove parlamentares, indicados conforme a proporcionalidade partidária pelos líderes das bancadas e blocos – não há prazo para esse procedimento. As indicações, conforme ocorrerem, podem ser consultadas no Sistema de Proposições Legislativas (SPL).

Instalado o colegiado, começa a contar prazo de 15 dias para a comissão especial apresentar parecer à sugestão de mudança na Lei Orgânica. Emendas à proposta só serão aceitas se assinadas por um terço dos 38 vereadores. A comissão especial pode decidir pelo arquivamento da iniciativa ou pela sua admissibilidade, caso em que a proposta será submetida ao plenário, em duas votações, com um intervalo mínimo de 10 dias entre o primeiro e segundo turno (trâmite definido pelo Regimento Interno, nos artigos 170 a 178).