Comunidades terapêuticas querem reconhecimento como modelo de tratamento

por Assessoria Comunicação publicado 19/04/2017 18h45, última modificação 15/10/2021 11h55

Sou fruto de uma comunidade terapêutica. Fui usuário de drogas por 8 anos e como bom usuário cheguei ao fundo da fossa, do poço, relatou o ex-dependente químico e hoje secretário da Federação Paranaense de Comunidades Terapêuticas Associadas (Compacta), Ricardo Miranda, em audiência pública realizada na Câmara de Vereadores. No debate desta quarta-feira (19), representantes destas comunidades defenderam a criação de uma política pública sobre drogas para Curitiba.

Para Miranda, o apoio do Poder Público é importante para garantir a continuidade de um modelo de tratamento que “funciona de fato, de verdade”. “Me trataram com respeito, com carinho, com amor. Hoje faz 8 anos que não uso mais drogas. Tenho minha família restaurada, os vínculos foram reestabelecidos, a confiança também”, completou o secretário do Compacta. “É uma mudança de estilo de vida destrutível para uma vida saudável.”

O reconhecimento desse modelo de tratamento da dependência química foi o mote da audiência pública, promovida por Ezequias Barros (PRP), presidente da Frente Parlamentar contra as Drogas. Após o relato do ex-dependente químico – que foi corroborado por cartazes em apoio às comunidades terapêuticas – quatro palestrantes apresentaram diferentes aspectos que envolvem o trabalho dessas instituições.  

Todos concordaram que o modelo funciona, tem respaldo na Política Nacional sobre Drogas e carece de investimentos públicos, sobretudo em Curitiba. Luiz Carlos Hauer, membro do Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas, explicou que as comunidades terapêuticas são responsáveis por 80% do tratamento da dependência química no Brasil, mas observou que a Prefeitura de Curitiba não tem convênios com essas entidades.

Além disso, o presidente da Compacta, Thiago Massolin, reiterou que o próprio Ministério da Saúde reconhece essas comunidades como equipamento da rede de atenção psicossocial, na portaria federal 3.088/2011. “É um serviço de saúde destinado a oferecer cuidados contínuos de saúde, de caráter residencial transitório por até 9 meses para adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas”, diz o documento.

“Se [a dependência química] é uma doença, envolve cinco áreas da vida de uma pessoa: espiritual (não relacionada à religião), psicológica, familiar, social e biológica”, analisou o psicólogo Nicácio Pereira de Mendonça, que abordou aspectos terapêuticos durante o debate. Para ele, se o trabalho da comunidade terapêutica for sério, ele será eficaz.  

“A comunidade terapêutica não interna: ela acolhe, ela trata, ela recupera”, completou Luiz Hauer. Já Marina Pires Machado, outra psicóloga, defendeu a profissionalização das comunidades terapêuticas, com equipes multidisciplinares, para garantir o tratamento adequado dos dependentes químicos e suas famílias. A convidada apresentou uma cartilha com diretrizes sobre o atendimento das entidades no Brasil.

Problema que atinge a todos
“Cada um de nós é responsável pelo local onde está inserido: família, comunidade. Não dá pra dizer que não temos nada com isso. O problema atinge qualquer classe. Todo dia cresce na nossa cidade”, observou Ezequias Barros. Para o vereador, só quem convive ou conviveu com a dependência química sabe a importância das comunidades terapêuticas.

“As drogas são uma questão de política pública. Esse tema vai além da repressão, é uma questão de saúde pública, educacional, de segurança pública, de desenvolvimento econômico. Política pública sobre drogas deve ser tratada de maneira ampla”, concordou o deputado estadual Alexandre Guimarães (PSC). O parlamentar é presidente da Frente Parlamentar de Política sobre Drogas da Assembleia Legislativa do Paraná.

O presidente da Fepact (Federação Paranaense das Comunidades Terapêuticas) foi enfático: “não existe receita para isso [o tratamento da dependência química] porque é um problema realmente complexo. No Paraná não existe política pública. Curitiba também não tem. Não tem quem ponha o chocalho no gato, não tem quem assuma isso.”

Ezequias Barros se comprometeu a recolher assinaturas da Frente Parlamentar contra as Drogas para um requerimento que recomendará à Prefeitura de Curitiba o reconhecimento do modelo de comunidade terapêutica como equipamento da RAPS, certificando e qualificando essas instituições. O documento ainda será protocolado para posterior votação única e simbólica em plenário.


Esta foi a segunda vez que o tema foi discutido na Câmara de Curitiba este mês, em 5 de abril, Thiago Aguilar Massolin, esteve na tribuna livre para pedir a abertura de vagas na rede de atenção psicossocial (veja aqui). Membros da frente parlamentar que participaram da audiência pública: Thiago Ferro (PSDB), Cristiano Santos (PV), Osias Moraes (PRB), Marcos Vieira (PDT) e Maria Leticia Fagundes (PV).

Confira o áudio da reunião