Aluguel Social para jovens de Casas Lares é rejeitado por vereadores de Curitiba
Camilla Gonda disse que o projeto deveria ter sido aprovado com base nos pareceres técnicos e que quem deveria julgar sua aplicabilidade seria o prefeito. (Foto: Carlos Costa/CMC)
Criado em 2015 pela Câmara Municipal de Curitiba (CMC), o Programa Aluguel Social (PAS) foi novamente colocado em pauta nesta terça-feira (23) no plenário do Legislativo. Camilla Gonda (PSB) defendeu a aprovação do projeto que ampliava o público que poderia ser beneficiado pela política pública, mas a iniciativa foi rejeitada pela maioria dos vereadores e vereadoras: foram 21 votos “não” e 7 votos “sim”.
A lei municipal 14.700/2015, que implantou o programa social, ainda não está regulamentada, mas prevê que o benefício financeiro mensal seja destinado ao pagamento de aluguel para famílias em situação habitacional de emergência e que têm renda baixa. Para ter acesso ao aluguel social, é preciso cumprir requisitos como morar há mais de um ano em Curitiba e não ter imóvel próprio, no Município ou fora dele. 
A norma também estabelece outras condições para ter acesso ao benefício: morar em áreas destinadas a obras de infraestrutura; ter a moradia destruída ou interditada por calamidades públicas, como deslizamentos, incêndios ou enchentes; viver em locais de risco apontados pela Defesa Civil; estar em situação de despejo ou estar cadastrada em programas de reassentamento habitacional. O benefício pode ser concedido por até 24 meses, prazo pode ser prorrogado em situações específicas definidas pela prefeitura.
Pela proposta de Camilla Gonda (005.00144.2025), que tramitou pelas comissões permanentes da CMC, recebendo quatro pareceres favoráveis, a ideia era que o apoio financeiro também fosse destinado a jovens egressos de Casas Lares. O benefício seria dado por até 24 meses ou até que eles conseguissem a moradia definitiva, seguindo as diretrizes já estabelecidas para outras famílias beneficiadas pelo PAS.
Para isto, a matéria pretendia alterar um inciso da norma. Como argumento, a autora defendeu que a iniciativa se baseia em programas semelhantes já adotados em outras cidades, como São Paulo, onde o “República Jovem” oferece moradia subsidiada a jovens sem suporte familiar. “No município de Curitiba, é responsabilidade do Executivo criar mecanismos de acolhimento que proporcionem condições para que esses jovens se tornem economicamente e emocionalmente independentes”, dizia a justificativa do texto.
Jovens precisam ser priorizados, argumentam vereadores favoráveis
Na defesa da proposta, Camilla Gonda observou que a “realidade é dura” para os jovens egressos das Casas Lares, pois “muitos saem sem família, sem condições financeiras e sem qualquer rede de apoio” e que, nestas condições, são pessoas que correm o risco de irem para as ruas e para invisibilidade social. Ela destacou ainda que o projeto era “simples, mas de enorme impacto”, pois permitia uma “transição mínima para que os jovens possam estudar, buscar trabalho, se estruturar e se consolidar como cidadãos plenos”.
“Alguns poderão questionar ‘por que priorizar este grupo?’. A resposta é clara: porque são jovens sem rede de apoio em um momento crítico de suas vidas. Sem o amparo do Estado, podem ser condenados a repetir ciclos de pobreza, exclusão e violência. E não podemos esquecer que a Constituição da República, em seu artigo 227, é taxativa: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à dignidade, à convivência comunitária e ao pleno desenvolvimento”, complementou a parlamentar.
Além da autora, outros seis vereadores que votaram favoravelmente saíram em defesa da iniciativa. Líder da Oposição, Vanda de Assis (PT) defendeu que o projeto daria condições para os jovens tivessem uma “oportunidade de vida segura” e disse que contava que a iniciativa fosse apoiada pela maioria do plenário. Já Marcos Vieira (PDT) analisou que a ideia era evitar um “choque de realidade” para os jovens que completam 18 anos e precisam procurar um novo lugar, e ingressar no mercado de trabalho, após saírem das casas de acolhimento.
Laís Leão (PDT), na mesma esteira, declarou apoio à medida, relembrando sua atuação como voluntária em uma Casa Lar e que acompanhou histórias de jovens que eram obrigados a sair do abrigo, e que não tinham “apoio, suporte, porto seguro” na nova fase. “Quando você completa 18 anos, e está longe de uma base familiar, qualquer iniciativa que a gente tenha para auxiliar esses jovens é positiva”, complementou a vereadora.
Outro parlamentar favorável à matéria foi Da Costa (União), que também discutiu a política pública proposta. “Esses jovens são colocados para fora destas Casas Lares, desses orfanatos, e temos que ter compromisso com eles. Votarei a favor. Não consigo ser canalha e votar contra por você ter uma ideologia contra a minha. [...] Não estou votando em você, estou votando no seu projeto e [a favor] desses jovens”, disse.
“Município não deixa de atender esses jovens”, analisou líder do Governo
Contrário à matéria, Serginho do Posto (PSD), líder do Governo na CMC, explicou que a lei do PAS é de 2015 e até o momento não foi regulamentada pelo Poder Executivo, tendo a função apenas autorizativa. “Ela foi criada com uma finalidade específica. [...] E a pretendida proposta era incluir um inciso à lei, que não está regulamentada. É importante entender que, a partir do momento que você especifica um grupo de pessoas a serem atendidas você pode criar uma barreira de atendimentos, segmentando uma lei”, argumentou o parlamentar. 
Segundo o vereador, a Prefeitura de Curitiba tem atendido jovens egressos das Casas Lares através da Fundação de Ação Social (FAS), que administra repúblicas em sete imóveis cedidos pela Cohab (Companhia de Habitação Popular de Curitiba). São apartamentos que totalizam 16 vagas e, “com base na avaliação técnica da equipe responsável pelo acompanhamento, os jovens passam por um processo de desligamento institucional”. Atualmente, 8 jovens estão acolhidos em 5 repúblicas, informou.
Questionado por Vanda de Assis sobre a razão do “projeto não ser aprovado”, Serginho respondeu que a Prefeitura de Curitiba “não está deixando de atender esse jovem”, não dentro do Programa Aluguel Social, mas “dentro da sua política de assistência social”. “Os objetivos são os mesmos, porém a forma como a prefeitura atua é dentro de um programa de governo para atendimento desse jovem”, reforçou. Para ele, a lei do PAS tem falhas, e por isso até hoje não foi regulamentada.
Outra vereadora que votou contrária à matéria, Delegada Tathiana Guzella (União) considerou que o projeto ficou “muito aberto”. “O jovem, segundo o Estatuto do Jovem, é uma pessoa de 15 a 29 anos, e o projeto não diz se é durante um ano, durante 6 meses. Seria mais valoroso ajudá-lo a conseguir um emprego, talvez com uma cota [de vagas] para o setor público e o setor privado. [...] Eu entendo a boa intenção e o olhar para o jovem, mas também vocẽ deixa indefinido o tempo. Juventude até os 29 anos? Acho que faltou uma limitação de tempo e espaço neste projeto”, acrescentou.
Para Angelo Vanhoni (PT), é preciso que o Estado ampare sempre, até que as pessoas possam se desenvolver. “As crianças das Casas Lares, quando completam 18 anos, vão se defrontar com o que na vida? Alguma coisa a gente podia pensar neste sentido, para amparar e ajudar neste desenvolvimento”, observou o parlamentar, que votou favoravelmente ao projeto de Camilla Gonda.
Resultado da votação gera debate em plenário
Apesar de receber os pareceres favoráveis das comissões de Constituição e Justiça (CCJ), de Economia, Finanças e Fiscalização, de Direitos Humanos, Segurança Pública, Defesa da Cidadania e Minorias e de Serviço Público, a proposta de lei foi derrubada pelo plenário, com 21 votos contrários. E o resultado foi criticado por Camilla Gonda, que se disse “surpresa de um direcionamento alterado, que não foi trazido às comissões temáticas” e que “dia para a noite, não se torna mais constitucional ou passível de aplicação”.
Veja abaixo como cada parlamentar votou:

A autora do projeto argumentou que o texto deveria ter sido aprovado com base nos pareceres técnicos e que quem deveria julgar sua aplicabilidade seria o prefeito Eduardo Pimentel, por meio do veto ou da sanção. Ela disse ainda que foi a primeira vez nesta legislatura que um projeto foi rejeitado pela CMC e que a “discussão do projeto se deu com pouquíssimos vereadores”, situação que, na sua opinião, mostra que a Casa é um “puxadinho do prefeito”. “Se o prefeito fala, eles aprovam, se o prefeito não fala, há a rejeição da pauta. [...] Eu queria muito que os vereadores tivessem se posicionado de maneira contrária. Tivessem levantado, ido até à tribuna e falado assim: ‘o projeto é ruim, não vai beneficiar ninguém, o projeto é fraco’”.
Professora Angela (PSOL) se disse “chocada” com o resultado da votação e avaliou que Camilla Gonda sofreu “violência de gênero”, pois tem uma “atuação ousada, independente, de oposição” e que teve um “projeto muito sólido” rejeitado. “O projeto foi colocado em pauta para posteriormente ser rejeitado, ser desvalorizado. Isto [aconteceu] para marcar território contra a atuação de mulheres que ousam ser uma voz dissidente dentro desta Casa. Não é sobre o projeto, é sobre quem propõe o projeto”, afirmou a vereadora.
Contrário à proposta, Pier Petruzziello (PP) saiu em defesa dos colegas que se posicionaram como ele na votação, e também do líder do prefeito. “Essa coisa de dizer ‘por que é de uma mulher, por que não é de uma mulher’ é um discurso que está atrapalhando a defesa da pauta da mulher. Respeito o posicionamento das vereadoras, cada um tem sua liberdade para falar absolutamente aquilo que achar ser necessário, porém esse discurso está ficando ultrapassado, está perdendo o sentido”, completou, ao observar que projeto de Laís Leão, que não integra a base, tinha acabado de ser aprovado pelo plenário em primeiro turno.
Eder Borges (PL), outro vereador a votar contra, pediu “urbanidade”, “respeito entre os pares e o respeito institucional”. Para ele, o uso do termo violência de gênero tem sido banalizado e é a “desculpa para tudo”. O vereador ponderou, ainda, que o debate “não pode ser algo juvenil, de ataques gratuitos a colegas e à instituição que fazemos parte”. “O líder da base orientou, argumentou, e [a maioria do] plenário optou por seguir sua orientação”, finalizou.
*Notícia revisada pelo estudante de Letras Celso Kummer
Supervisão do estágio: Ricardo Marques
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba