Câmara de Curitiba aprova incentivo à consulta de antecedentes criminais

por Pedritta Marihá Garcia | Revisão: Celso Kummer* — publicado 16/09/2025 16h45, última modificação 17/09/2025 14h36
Projeto de lei de Olimpio Araujo Junior (PL) recebeu 30 votos “sim”, mas vereadoras favoráveis à matéria fizeram críticas ao autor.
Câmara de Curitiba aprova incentivo à consulta de antecedentes criminais

Olimpio Araujo Junior defendeu que o projeto tem caráter preventivo e educativo. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, nesta terça-feira (16), em primeiro turno, o projeto de lei com a justificativa de incentivar condutas de segurança entre as mulheres. A iniciativa é de autoria de Olimpio Araujo Junior (PL) e recebeu 30 votos favoráveis, unanimidade no momento da votação. A discussão da matéria mobilizou o debate entre 12 dos 38 parlamentares, sendo a maioria integrantes da bancada feminina do Legislativo.

A ideia da proposta é determinar às instituições públicas e privadas, direcionadas à assistência e ao acompanhamento das mulheres, além dos órgãos de execução da política de proteção e promoção dos direitos da mulher, que divulguem sites e demais canais de consulta sobre antecedentes criminais (005.00288.2025). O projeto também prevê a realização de campanhas e outras ações com a intenção de incentivar as mulheres a buscar o histórico de eventuais agressões ou condutas agressivas de seus parceiros.

Autor da proposta, o vereador Olimpio Araujo Junior alertou sobre o aumento dos feminicídios no Paraná em 20%, conforme dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). “O maior crescimento aconteceu em Curitiba, que saiu de um feminicídio no ano de 2023 para 7 em 2024, uma variação de 600%”, cita a justificativa da matéria.

Em plenário, o parlamentar destacou que o objetivo é fornecer informação como forma de proteção, permitindo que as mulheres identifiquem riscos antes de se envolver em relacionamentos que possam resultar em violência. Segundo Olimpio, a medida não se trata de um julgamento prévio, mas de um instrumento de cuidado.

“A possibilidade de consultar os antecedentes criminais não é um julgamento prévio, mas sim um escudo de proteção. É uma chance de as mulheres terem acesso à informação que pode salvar suas vidas, antes que o ciclo de violência comece”, afirmou ele, ao pedir a aprovação da matéria.

O vereador ressaltou ainda que a proposta está em conformidade com a Constituição Federal e a Lei Orgânica do Município, além de reforçar as diretrizes do Plano Municipal de Políticas para Mulheres 2023-2026. Ele também agradeceu à Comissão de Direitos Humanos, Defesa da Cidadania, Segurança Pública e Minorias, que atestou a relevância social da medida, e concluiu pedindo o apoio dos colegas para a aprovação, a fim de reafirmar que a CMC é “um lugar de cuidado e proteção” para as mulheres.

Emendas supressivas da CCJ foram aprovadas

Duas emendas de autoria da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que fizeram ajustes ao texto original, foram aprovadas pelo plenário, ambas com 30 votos “sim”. A ideia foi suprimir do texto o parágrafo 2º, que determina que "os órgãos detentores das informações sobre antecedentes criminais devem implementar e viabilizar o acesso e as consultas solicitadas". Nos termos parágrafo 1º, esses dados referem-se apenas aos casos de "violência doméstica, crimes praticados com violência contra a pessoa ou grave ameaça". Os parágrafos removidos da redação interferiam em prerrogativas de órgãos estaduais e federais, por restringirem e por criarem atribuições a eles (033.00024.2025 e 033.00025.2025).

Votação recebe apoio de procuradoras da Mulher

A iniciativa de Olimpio Araujo Junior recebeu elogios de parte da atual gestão da Procuradoria da Mulher da CMC e outros vereadores. De acordo com Carlise Kwiatkowski (PL), procuradora da Mulher, só no primeiro semestre, 45 mulheres no Paraná foram vítimas de feminicídio. E em 2024, foram mais de 90 mil boletins de ocorrência registrados de mulheres que sofreram ameaças. Em sua análise, projetos como esse pretendem “expor aqueles que violam os direitos das mulheres” e contribuem para a redução da violência contra a mulher. 

Primeira-procuradora-adjunta da Mulher, Rafaela Lupion (PSD) analisou a necessidade de “fortalecer as políticas públicas nesta direção”. “Felizes nós, a maior bancada feminina da história desta Casa Legislativa, em ver um homem apresentando uma proposição como essa. Esse debate tem que ser geral e global: homens e mulheres conscientizados, pois temos, sim, que combater essa violência. [...] Parabéns por esse olhar sempre sensibilizado à causa das mulheres”, complementou. 

“Vivemos um momento em que, ao mesmo tempo, temos um alto índice de violência doméstica, e temos um aumento do índice de feminicídio. E isso significa dizer que o homem, no geral, não está aceitando as denúncias que vem recebendo, porque senão os índices de feminicídio não aumentariam”, disse a vereadora Delegada Tathiana Guzella (União). Outra a apoiar a matéria foi Indiara Barbosa (Novo), segunda-secretária da Câmara Municipal. Ela lamentou que Curitiba ainda conta com altos índices de violência doméstica, mas o projeto de lei é uma “oportunidade de falar sobre um problema que existe, de melhorar as políticas públicas que já existem nesta área”.

Para Meri Martins (Republicanos), é preciso aumentar a proteção das mulheres cada vez mais. “Quanto mais informações tivermos dos antecedentes daquela pessoa, isso dá mais proteção às mulheres. [...] Isso não é exposição. A partir do momento que eles cometeram os crimes e não respeitaram os limites, porque nós temos que respeitar limites de não mostrar o que eles fizeram de errado contra uma mulher?”, afirmou a parlamentar, que é a terceira-secretária da CMC. 

Líder do Governo, Serginho do Posto (PSD) analisou que, apesar da Lei Maria da Penha representar um marco no combate à violência doméstica, dando “uma certa segurança” às mulheres, a violência tem sido “contínua” nos últimos anos. Ele parabenizou Olimpio Araujo Jr. pelo projeto e disse que “promover uma condição de segurança” já vale a pena. Eder Borges (PL), Jasson Goulart (Republicanos) e a vereadora Sargento Tania Guerreiro (Pode) também se somaram aos colegas, endossando a relevância da proposta. 

Vereadoras criticam o autor do projeto 

Apesar da votação unânime, quatro vereadoras fizeram críticas ao autor do projeto de lei, acusando-o de cometer violência política de gênero. Professora Angela (PSOL) afirmou que há uma “profunda e inaceitável contradição”, já que, segundo ela, Olimpio Araujo Junior teria praticado violência política de gênero contra parlamentares desta Casa, inclusive contra o seu mandato, com denúncia já formalizada na Procuradoria da Mulher da Câmara Municipal.

Segundo a vereadora, os episódios envolveram ataques pessoais, distorções de falas, desqualificação de seu partido e de seus eleitores, além de insinuações que buscariam “silenciar e colocar em risco” sua integridade. “Isso, senhoras e senhores, tem nome: é violência política de gênero, tipificada pela lei federal 14.192/2021. É uma tática para constranger, humilhar e dificultar o desempenho do meu mandato eletivo”, declarou, acrescentando que outras parlamentares também já teriam sido alvo de comportamentos semelhantes no plenário.

A vereadora Professora Angela também criticou o conteúdo do projeto que, em sua avaliação, adota uma visão “superficial e punitivista” ao incentivar a consulta de antecedentes criminais como forma de prevenção. Para ela, a medida transfere a responsabilidade da proteção individualmente às mulheres e pode gerar estigmatização e uma falsa sensação de segurança. Ela ainda defendeu que a verdadeira proteção se constrói com políticas públicas estruturais, como o fortalecimento da rede de atendimento, a educação para igualdade de gênero, a autonomia econômica e o compromisso dos agentes públicos em combater a misoginia.

Após afirmar que teve uma “crise de pânico antes de chegar na Câmara de Curitiba” e que se questionou se iria ou não debater o projeto de lei, a vereadora Camilla Gonda (PSB) corroborou da afirmação de Angela, relembrando também ter vivido episódios similares no exercício do seu mandato. “É importante dizer que, no começo desse ano, eu fui vítima de violência política de gênero nesta Casa, todo mundo presenciou isso. [...] O problema é quando uma vereadora sofre violência política de gênero e a Casa, como um todo, não se manifesta, mas se manifesta para parabenizar o vereador que praticou essa violência”, disse, em referência ao parlamentar.

Camilla Gonda frisou, ainda, que votará “sim” em todas as propostas que versem sobre as mulheres, mas observou ser necessário que o voto sim seja “pelas mulheres que trabalham do nosso lado e que estão com a gente o dia inteiro”. “Não adianta votar sim e passar por cima de violências que acontecem dentro da própria Câmara Municipal de Curitiba”, complementou. Vanda de Assis (PT), segunda-procuradora-adjunta da Mulher na CMC também endossou as falas das colegas da bancada feminina.

Para Giorgia Prates - Mandata Preta (PT), quarta-secretária do Legislativo e ex-procuradora-adjunta da Mulher, quando se fala da defesa das mulheres, é preciso ser “coerente”. “Não dá ser coerente e dizer ‘nós estamos a favor’, quando na verdade você é o próprio agressor. A gente tem que tomar cuidado com isso. Não podemos transformar isso em um jogo político de direita e esquerda [...]. Aqui nós temos poucas mulheres e todas as mulheres se levantam quando a gente vai falar sobre violência política de gênero?”, questionou a vereadora.

O projeto de lei foi aprovado em primeiro turno e precisa retornar à pauta de amanhã (17), em segunda votação, antes de estar pronto para sanção. Se a iniciativa for ratificada e sancionada pelo prefeito, a lei começa a valer 60 dias depois da publicação no Diário Oficial do Município (DOM).

*Notícia revisada pelo estudante de Letras Celso Kummer
Supervisão do estágio: Ricardo Marques