Livros digitais sobre comunicação eleitoral são lançados na Câmara de Curitiba

por Assessoria Comunicação publicado 03/12/2019 10h50, última modificação 12/11/2021 08h06

A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) sediou, a noite desta segunda-feira (2), o lançamento de dois livros digitais: “As eleições estaduais no Brasil: estratégias de campanha para TV” e “O Brasil vai às urnas: as campanhas eleitorais para presidente na TV e internet”, ambos organizados pelos pesquisadores Ricardo Tesseroli e Pedro Pimentel. O evento, que foi uma parceria entre o mandato da vereadora Professora Josete (PT) e o Grupo de Pesquisa em Comunicação Eleitoral (CEL) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), teve por título “Reflexões retrospectivas e prospectivas da democracia no Brasil: as corridas eleitorais de 2018, 2020 e 2022”.

Para Josete, “a Câmara deve ser um espaço aberto para a comunidade e para o processo de construção de cidadania. O Legislativo precisa estar atento aos debates que acontecem na academia, à pesquisa e a produção de conhecimento, especialmente neste momento de ataque às universidades. Passamos nos últimos anos por um processo de desconstrução da política, de todos os políticos e do próprio processo eleitoral que, apesar de suas falhas, ainda é fundamental para a democracia. Neste sentido é nosso papel trazer ao Legislativo debates qualificados como o que foi trazido pelos professores e professoras da UFPR”.

O evento foi dividido em dois momentos. Inicialmente os organizadores dos livros falaram sobre como eles foram elaborados. Em seguida, realizou-se uma mesa redonda sobre “Cenários políticos da democracia brasileira: a ponte entre 2018, 2020 e 2022”, com a participação dos professores-doutores da UFPR e integrantes do CEL/UFPR Ary Azevedo Júnior, Luciana Panke e Mario Messagi Júnior. A vereadora Maria Letícia Fagundes (PV) também participou do evento.

Robson Sabino, diretor das Comissões da Câmara Municipal, saudou a todos e disse, em nome de Sabino Picolo (DEM), presidente da Casa, que a Câmara sempre estará aberta para eventos dessa natureza. “Tanto a Universidade Federal do Paraná como quaisquer outras instituições de ensino poderão fazer uso desse espaço para divulgar seus estudos e pesquisas”, disse ele. Lucas Nekel da Silva, estudante de Ciência Política da UFPR reiterou as palavras e comentou sobre o projeto Câmara Municipal Universitária (CMU), uma simulação de atividades parlamentares feita por estudantes de cursos diversos. O projeto é resultado da parceria realizada entre o Projeto de Extensão lotado no Setor de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Paraná, a Câmara Municipal de Curitiba e a Comissão Organizadora do CMU.

Metodologia
Ricardo Tesseroli, responsável por falar sobre o livro que trata das eleições estaduais, explicou que os dois livros constituem pesquisas que foram feitas a partir de uma metodologia desenvolvida há mais de dez anos. A metodologia consiste em estudar prioritariamente o horário gratuito de propaganda eleitoral (HGPE). “Os programas foram salvos transcritos e posteriormente divididos em 10 categorias, dentre elas, segurança pública, emprego, saúde, infraestrutura e gênero. A partir dessa análise é possível saber quanto tempo os candidatos dedicaram a essas temáticas em seus espaços eleitorais”, disse Tesseroli.

Com base nos dados, foi possível aferir quais os principais temas discutidos no programa eleitoral gratuito como também ter uma contextualização do cenário político em cada estado onde a pesquisa foi feita. Tesseroli frisou que a elaboração dos livros foi um desafio muito grande que envolveu mais de 70 pesquisadores de todo o Brasil. “O resultado é gratificante, pois mostra as semelhanças e diferenças entre as campanhas eleitorais nos diversos estados”.

Coube a Pedro Pimentel comentar o livro que abordou a campanha eleitoral para presidente. De acordo cm ele, as duas pesquisas são o “resultado da junção de cérebros que resolveram ir além das disputas e polarizações para chegar num resultado crítico. Esses livros foram um esforço para gente fugir de alguns lugares comuns, fazer o indivíduo sair das suas atomizações”. Pimentel explicou que o livro sobre as eleições presidenciais é dividido em 4 seções, sendo que a primeira trabalha com campanhas online (uso das mídias sociais, Fake News, etc). Na segunda parte, são abordadas as campanhas tradicionais (espaço em tv, debates, uso de pesquisas de opinião pública, mulheres na política). A terceira parte trata das mobilizações sociais em período eleitoral e a quarta aborda o olhar internacional sobre o cenário brasileiro.

Análise política
Em seguida falaram os professores-doutores da UFPR e integrantes do CEL/UFPR Ary Azevedo Júnior, Luciana Panke e Mario Messagi Júnior. Luciana Panke esclareceu que a gênese da metodologia usada nos livros aconteceu durante as eleições de 2010. “É possível observar um encadeamento político-ideológico-comunicacional entre os eventos de 2010 e os de hoje, pois a polarização política não é de agora, ela já vem de algum tempo”.  Ela lembrou que em 2010 foi eleita a primeira mulher presidente do Brasil, mas em 2014 o cenário já era muito diferente em função da insatisfação contra a Copa do Mundo e também dos protestos que marcaram 2013. Para a professora, se já havia a narrativa política da corrupção apontada para o governo federal, a construção do “inimigo único” foi muito mais fácil e, nesse sentido, até as cores (verde, amarelo e vermelho) agregaram significados que antes não possuíam.

Luciana Panke aponta para a personalização das figuras públicas que resulta no populismo (que pode ser de direita ou esquerda). “No caso do presidente Jair Bolsonaro, você tem um líder destacado, carismático que fala o que seu eleitorado deseja. Defende pautas abstratas, faz uso de um apelo emocional muito grande e se vale de um fundo religioso”. Ela complementou que “curiosamente, em 2010 não se sabia quem ele era. Tampouco em 2014. Mas alguns fatores como a prisão do ex-presidente Lula criaram o ambiente para o fortalecimento de Bolsonaro”. A professora Luciana Panke não acredita que a polarização vá acabar a curto prazo. “Vai depender agora das eleições municipais, mas há também quem esteja descontente com os dois lados, o que pode viabilizar o surgimento de uma terceira via”.

Para o professor Ary Azevedo Júnior as eleições de 2018 foram marcadas por um crescimento exponencial da internet principalmente por meio dos dispositivos móveis. Segundo ele, vivemos o fenômeno da “hiperinformação”, o que provoca a perda de referência. “Essa hiperinformação pode gerar duas consequências: a anomia, que é a falta de interesse das pessoas em participar de qualquer discussão; e a alienação, que ocorre quando as pessoas começam a acreditar no mundo de acordo com a ótica dos grupos sociais aos quais elas pertencem”, explicou o professor exemplificando com o indivíduo que faz suas escolhas políticas com base nas tendências de seus círculos sociais.

Azevedo Júnior entende que muitas variáveis devem ser consideradas ao se analisar o fenômeno Bolsonaro. Para ele, “o Brasil acaba sendo um reflexo do avanço global do conservadorismo”. Ele indicou também um aumento na criminalização da política, fenômeno internacional que pode ser percebido na quantidade de notícias negativas veiculadas pela imprensa sobre o tema. O estudioso disse que é necessário “reforçar a participação democrática para evitar que os mesmos grupos se perpetuem no poder”.

De acordo com o professor Mário Messagi, a eleição de Bolsonaro foi surpreendente para todos os que estudam o assunto. “O PSDB, por exemplo, não acreditava que ele tivesse forças para vencer no primeiro turno e achava ainda que se ele fosse para o segundo turno, não seria um candidato com chances. Mas a facada mudou tudo”. Ele citou o “antipetismo” como um dos fatores que contribuíram para o crescimento de Bolsonaro e também mencionou a influência evangélica. “Há um projeto político das igrejas neo-pentecostais que está sendo gerado há décadas nesse país. O objetivo é fazer com que o Brasil deixe de ser laico”, afirmou Messagi.

Para o professor, é necessário levar em consideração também o apoio dado a Bolsonaro por militares não só do Exército como das polícias militares estaduais. E, também, a simpatia de uma parcela do empresariado brasileiro, representada, segundo Messagi, de forma caricata por Luciano Hang, dono da empresa Havan. Messagi indicou o crescimento do “antibolsonarismo” recente que, segundo ele, pode renovar o cenário político nacional.