Câmara libera uso do celular nos bancos de Curitiba

por Fernanda Foggiato | Revisão: Brunno Abati* — publicado 20/03/2023 13h45, última modificação 21/03/2023 08h42
Aprovado em primeiro turno pela diferença de um voto, o projeto terá nova votação, prevista para terça (21).
Câmara libera uso do celular nos bancos de Curitiba

“A gente está punindo o cidadão, o usuário do banco que não é criminoso”, disse Amália Tortato. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

Nessa segunda-feira (20), a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) retomou o debate do projeto de lei com o objetivo de liberar o uso e o porte do celular nas agências bancárias da capital. De iniciativa da vereadora Amália Tortato (Novo), a proposta foi aprovada em primeiro turno pelo placar de 14 “sim” e 13 “não”, além de 6 abstenções (005.00172.2022). 

Como o painel registrou um empate entre os vereadores favoráveis e os contrários à liberação – 13 de cada lado –, coube ao presidente Marcelo Fachinello (PSC) desempatar nominalmente a votação. O segundo turno do projeto de lei está previsto para a sessão dessa terça (21). Se confirmada, a matéria poderá ser encaminhada para a sanção ou para o veto do Executivo. 

O projeto chegou a entrar na pauta do plenário, em 14 de fevereiro, mas a autora concordou em adiar a votação, por dez sessões, para que fosse realizada uma audiência pública na Câmara Municipal, no dia 10 março. Durante a atividade, o Sindicato dos Vigilantes de Curitiba e Região, hoje presente em plenário, manifestou-se contra a mudança na lei, enquanto a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e o secretário Péricles de Matos defenderam o fim da restrição. 

O uso e o porte de celulares nas agências bancárias, inicialmente, constava na lei municipal 13.518/2010, aprovada com a justificativa de promover a segurança de clientes e de funcionários dos estabelecimentos financeiros, já que o golpe da “saidinha de banco”, à época, era comum. Depois, a norma foi incorporada pelo Estatuto da Segurança Bancária, a lei 14.644/2015

Na “saidinha de banco”, um criminoso dentro da agência observa a movimentação dos clientes, como saques de dinheiro, e um comparsa aborda a pessoa do lado de fora do estabelecimento, cometendo o assalto ou o furto. Além de proibir o uso do celular nas agências, a lei de 2010, proposta por Tito Zeglin (PDT), determinou a instalação de biombos entre quem está na fila e os caixas para impedir a identificação visual dos clientes. 

O projeto de Amália Tortato não altera a exigência dos biombos. A ideia é revogar apenas o inciso 3º do artigo 2º e a integralidade do artigo 3º do Estatuto da Segurança Bancária, dispositivos que têm relação com o porte e com o uso do celular. Hoje, a norma inclusive autoriza os estabelecimentos financeiros a apreender aparelhos de telefone em uso dentro das agências, como medida de prevenção de delitos. 

“A gente está punindo o cidadão, o usuário do banco que não é criminoso, de ter acesso a um bem que é seu, um bem particular, que é o celular, para coibir os criminosos”, defendeu Tortato. “Em 2010, era quase apenas só um telefone. Hoje é um instrumento de inclusão, [...] uma ferramenta de cidadania, nossos documentos estão dentro do celular, e ele aumenta nosso grau de segurança. Você vai a uma agência e precisa do celular para concluir uma transação".

“Assim como lá em 2009 e em 2010 houve aquela onda para proibir o celular [devido à saidinha], nós estamos observando um movimento contrário”, disse Tortato. Segundo ela, a proibição já caiu em outros locais do Brasil, a exemplo do estado da Paraíba, e o crime da saidinha continuaria “zerado”. 

Apoios
Durante a discussão do projeto, que ocupou a maior parte da sessão plenária, a Sargento Tânia Guerreiro (União) declarou apoio à proposta: “Hoje em dia, ninguém mais faz grandes transações de dinheiro como era antigamente e tem os biombos nos bancos”. Para ela, o necessário é punir com mais rigor os criminosos. “Vou votar favorável com o projeto por entender que a lei está inócua”, afirmou Ezequias Barros (PMB). 

“Eu queria lembrar a vocês que a lei não proíbe só de falar no celular. Como nós vamos proibir de mexer na principal ferramenta de transição e de trabalho de um banco?”, questionou Alexandre Leprevost (Solidariedade). Manter a redação atual, opinou, “é uma incoerência pura”. “O banco nos incentiva a mexer no celular e a gente quer manter uma lei que proíbe mexer no celular".

“Vou encaminhar o voto favorável à derrubada dessa exigência na mesma esteira do vereador Alexandre Leprevost. Nós vivemos uma outra realidade”, afirmou Osias Moraes (Republicanos). “É uma lei que foi muito importante alguns anos atrás, cumpriu sua função, cumpriu com seu papel, mas hoje é uma lei que não mais se aplica”, comentou Eder Borges (PP). 

Professor Euler (MDB) sugeriu que, assim como na Paraíba, os crimes sejam monitorados, para, se necessário, voltar atrás da revogação. “Que haja um compromisso de a gente fiscalizar o que vai acontecer nos próximos anos”, declarou. Mauro Ignácio (União) defendeu a revisão das “letras mortas” da legislação municipal. O ponto central, avaliou, é que assumam a responsabilidade pela segurança dos clientes. A vítima de um crime, completou Rodrigo Marcial (Novo), é indenizada pela instituição bancária, inclusive, por danos morais. “Para que tenhamos uma boa prestação de serviço, precisamos também do celular nos bancos.” 

Contrapontos
Para Rodrigo Reis (União), “já há um bom-senso dentro das agências bancárias e não há um rigor absoluto de encostar no celular”. “A preocupação dessas empresas de segurança é com a liberação geral do uso do celular. Nós poderemos ter pessoas filmando dentro das agências”, citou. 

“Na minha avaliação, é mais um motivo para derrubar essa lei que está em vigor. Se ela não é efetivamente aplicada, não há necessidade para existir”, respondeu Tortato. Ela defendeu que seria melhor derrubar a restrição e que cada agência decida como cuidar de si própria. 

De acordo com Professora Josete (PT), a lei “pegou por um tempo” e trazia mais tranquilidade para clientes e funcionários dos bancos. Hoje, por mais que os aplicativos tenham reduzido a necessidade das transações presenciais, ela lembrou que a prática ainda é comum para as pessoas idosas. “A sua aposentadoria geralmente se limita a um salário mínimo ou um pouco mais. E ainda é hábito de muitas dessas pessoas irem sozinhas às agências e sacar todo o seu salário”, explicou. 

Autor da lei depois incorporada ao Estatuto da Segurança Bancária, Tito Zeglin argumentou que “se nós salvarmos uma vida, já estamos no lucro”. “Nós, vereadores de Curitiba, não aguentávamos mais tantos pedidos para que resolvêssemos a situação”, lembrou. Além de frisar outros instrumentos para a segurança bancária, como os biombos, ele acrescentou que a lei “viajou o Brasil inteiro”. “Poderíamos melhorar esta lei. Hoje, diante do gerente, ninguém é proibido de usar o celular”, propôs. 

Seguindo a mesma linha, Toninho da Farmácia (União) disse que seria necessário fazer a lei ser cumprida para “garantir a segurança, garantir a vida”. “O cidadão estar livre para fazer o que quiser com o celular, daí já muda de figura”, opinou. Noemia Rocha (MDB) também citou a preocupação com a segurança pública e, em especial, com as pessoas idosas, já que muitas são usuárias das agências bancárias. “Nós estamos tratando de vidas aqui. Essa análise que a gente tem que fazer”, pediu.

Giorgia Prates – Mandata Preta (PT) concordou com a fala, defendendo que se priorize a segurança e a autonomia dos vigilantes. Maria Leticia (PV) ponderou que a tendência, com o tempo, é que os planos migrem apenas para as plataformas digitais. Portanto, em sua avaliação, é necessário refletir principalmente sobre a segurança e sobre o emprego dos trabalhadores. Marcial, por sua vez, rebateu que a mesma lógica poderia ser usada para proibir carros e motos, que também causam mortes. 

O líder do governo, Tico Kuzma (sem partido), liberou o voto da base. Ele ressaltou a explicação feita por Tito Zeglin, do contexto em que a lei foi aprovada, e ressaltou que a regra “trouxe um resultado”. Por outro lado, ele apontou que alguns gerentes procuraram vereadores para apoiar a liberação e que o debate levantado por Tortato é importante. “É uma discussão difícil. A gente fica com o coração dividido entre a razão, a emoção".

As sessões plenárias são realizadas de segunda a quarta-feira, a partir das 9 horas, com transmissão ao vivo pelos canais da Câmara de Curitiba no YouTube, no Facebook e no Twitter.


*Notícia revisada pelo estudante de Letras Brunno Abati
Supervisão do estágio: Alex Gruba