Câmara aprova recomposição da inflação ao funcionalismo de Curitiba

por José Lázaro Jr. — publicado 12/01/2022 19h45, última modificação 13/01/2022 07h52
Emendas que não concediam o reajuste da inflação aos agentes políticos do Executivo e ao subsídio dos parlamentares foram rejeitadas pela maioria dos vereadores.
Câmara aprova recomposição da inflação ao funcionalismo de Curitiba

A sessão extraordinária foi realizada de forma online e transmitida ao vivo pelas redes sociais. (Foto: Carlos Costa/CMC)

Nesta quarta-feira (12), após cinco horas de discussão em plenário, os vereadores da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovaram, em primeiro turno, os projetos de lei que concedem a recomposição da inflação aos servidores do Executivo e do Legislativo, incluindo os agentes políticos e o subsídio dos parlamentares. Para entrarem em vigor, os reajustes precisam ser ratificados amanhã, na quinta (13), na votação em segundo turno, e depois sancionados pelo prefeito, com publicação no Diário Oficial do Município.

Com a rejeição das emendas pelo plenário, foram aprovados os textos originais dos cinco projetos de lei que tratavam da reposição da inflação. Isto significa que será concedido 13,71%, aos servidores e agentes políticos do Executivo, 19,22% aos funcionários do Legislativo e 11,59% aos vereadores. Hoje também foi aprovado o reajuste da inflação aos conselheiros tutelares (confira aqui). A sessão foi realizada de forma remota, totalmente pela internet, sem o sistema híbrido do plenário, num momento em que a CMC observa a situação da pandemia na capital.

>> Leia também:
Subsídio dos conselheiros tutelares da capital será de R$ 5,5 mil
Atualização no Estatuto dos Servidores da CMC acatada em 1º turno

Reajustes do Executivo
As reposições aos funcionários e aos agentes políticos da Prefeitura de Curitiba são objeto de dois projetos de lei (005.00001.2022 e 005.00002.2022), que concedem, respectivamente, 3,14% e 10,25%. Como um incide sobre o outro, a aplicação de ambos resulta no índice pretendido pelo Executivo, de 13,71%. As reposições abarcam a inflação aferida de outubro de 2019 a setembro de 2021 (24 meses), apurada pelo IPCA. Segundo cálculo anexado aos projetos, o impacto da medida nas contas da prefeitura é de R$ 386 milhões neste ano.

Em resposta a questionamento da Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização, a Prefeitura de Curitiba esclareceu que o índice será pago aos servidores concursados, aos funcionários admitidos por PSS e aos agentes comunitários de saúde e de combate a endemias. Sobre o impacto na previdência, ele será de R$ 271 milhões, que o Executivo disse, no mesmo documento, que, como “a folha de inativos é custeada pelo valor da contribuição de ativos e inativos”, ela “deve subir proporcionalmente possibilitando os pagamentos”.

Ambos os projetos foram aprovados com o mesmo placar, com 34 votos favoráveis, 2 contrários e 1 abstenção. Foram rejeitadas, pela maioria dos parlamentares, as emendas protocoladas por Flávia Francischini (PSL), Amália Tortato (Novo), Indiara Barbosa (Novo) e Denian Couto (Pode) buscando excluir do reajuste os agentes políticos do Executivo (033.00004.2022 e 033.00005.2022). O plenário também rejeitou propostas de Carol Dartora (PT), Maria Leticia (PV) e Professora Josete (PT) para substituir o IPCA pelo INPC, que resultaria em um reajuste maior que o sugerido pelo Executivo (034.00001.2022 e 034.00002.2022).

Reajustes do Legislativo
O projeto de lei tratando do reajuste da inflação na Câmara Municipal de Curitiba foi aprovado com 32 votos favoráveis, 2 contrários e 2 abstenções. A proposta é de 19,22%, referente ao IPCA apurado em 29 meses (005.00006.2022). “Ou seja, o índice da CMC é maior do que o da prefeitura porque o período apurado é igualmente maior”, explicou, em plenário, Tico Kuzma (Pros), presidente do Legislativo, que assina a proposta com a segunda secretária, Professora Josete (PT). Foram considerados 16,22% apurados entre outubro de 2019 e novembro de 2021 e 3% a título de complementação do período da data-base referente aos meses de dezembro de 2021 e janeiro e fevereiro de 2022.

Na mesma iniciativa da CMC, em atendimento à lei municipal 15.655/2020, está prevista a revisão de 11,59% ao subsídio dos vereadores, que corresponde à perda inflacionária acumulada, segundo o IPCA, no período de julho de 2020 (pró-rata) a setembro de 2021. Isto elevará o subsídio de R$ 15,5 mil para R$ 17,4 mil, sem aumentar a remuneração do presidente da CMC, de R$ 18,9 mil, que é limitada a 75% do subsídio dos deputados estaduais - a regra do “abate teto”.

Após a discussão em plenário, foi rejeitada por 26 a 9 votos, a emenda que suprimia a reposição da inflação ao subsídio dos parlamentares (033.00006.2022). A proposta também foi apresentada por Flávia Francischini, Indiara Barbosa, Amália Tortato e Denian Couto, que no projeto do Executivo propuseram excluir os agentes políticos da política de recomposição salarial. O impacto total do reajuste na CMC, em 2022, é de R$ 61,6 milhões (confira aqui).

Discussão dos projetos
O debate que dominou o plenário nesta quarta-feira foi se a Câmara de Curitiba deveria, ou não, conceder o reajuste da inflação somente ao funcionalismo público, excluindo agentes políticos e parlamentares. Prevaleceu a tese da isonomia de tratamento, amparada no inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, apesar dos protestos dos vereadores autores das emendas que propunham essa mudança. 

Para Flávia Francischini, que tomou a iniciativa de protocolar a segregação dos agentes políticos e parlamentares da recomposição da inflação, essa seria a hora errada de aprovar o reajuste. “Nós, agentes políticos e representantes do povo, devemos pensar e agir com extrema responsabilidade, então nada é mais justo que nos retirarmos dessa recomposição para dar o suporte necessário aos servidores e preservar capital para auxiliar a população nesta difícil caminhada [de combate à pandemia]”, afirmou. 

Para Indiara Barbosa e Amália Tortato, a discussão da proposta foi obstaculizada pela falta de dados do Executivo em relação à matéria. “Existem problemas nos aspectos financeiros e nos aspectos políticos”, resumiu Indiara, destacando que a Prefeitura de Curitiba não mandou a memória detalhada do cálculo, que R$ 340 milhões do impacto financeiro não constam na Lei Orçamentária Anual e que “precisamos saber de onde virá esse valor”. Ela defende que há jurisprudência para questionar o reajuste de agentes políticos na forma que foi feita pelo Executivo.

“Quais despesas vão cortar? Não existe mágica, não existe árvore do dinheiro”, continuou Amália Tortato. Podemos escolher dar reajuste para 40 mil servidores públicos municipais, em vez de destinar para outras áreas. Os servidores não tiveram o emprego ameaçado na pandemia. Estamos aumentando o custo fixo em nome de um provável superávit, mas e amanhã, se faltar dinheiro?”, questionou a parlamentar.

A resposta foi dada por Pier Petruzziello (PTB), líder do governo na CMC, que afirmou haver recursos suficientes em caixa para fazer frente à despesa. “Temos R$ 3 bilhões para investimentos em caixa e estamos falando de R$ 300 milhões. É um dinheiro fácil, que já estava declarado e detalhado na previsão orçamentária”, disse. O parlamentar disse ver, nas críticas das vereadoras do Novo, “um discurso fácil e demagógico”. A troca de alfinetadas chegou a ser criticada por Maria Leticia (PV) no decorrer da sessão, que afirmou não ver nada construtivo na disputa.

“Prefeito, vice-prefeito e secretários já ocupam o topo do serviço público em Curitiba. Aprovar [o reajuste] é um ato de claríssima imoralidade. A realidade lá do lado de fora é de incerteza, em que a pessoa não sabe se manterá o emprego”, questionou Denian Couto, dizendo que “os políticos têm que dar o exemplo”. “Reajuste de R$ 4 mil para o prefeito é imoral, é desonesto”, completou. 

O contraponto foi dado por Ezequias Barros (PMB), para quem a palavra “imoral” estaria fora de contexto. “Para um é reajuste, para outro é aumento? É cômico”, disse, defendendo a tese da isonomia de tratamento. Na mesma linha, Sidnei Toaldo (Patriota) afirmou que as dificuldades enfrentadas por parte da população “não são justificativa para reparar as perdas das categorias que podemos atender, ainda mais o funcionalismo público, que teve um papel crucial na pandemia”, defendeu o parlamentar. “Temos muito respeito pelos profissionais da Saúde e o  recurso vai fazer girar a economia”, concordou João da 5 Irmãos. 

Ao tratar do assunto, Tico Kuzma frisou justamente esse ponto, que em nenhum dos projetos está prevista reposição salarial acima da inflação e que a votação agora, no recesso parlamentar, foi um pedido do próprio funcionalismo público. “O reajuste não prejudica outros serviços públicos do Município”, disse Serginho do Posto, opondo-se também aos argumentos das vereadoras do Partido Novo. Noemia Rocha (MDB) defendeu que deveria haver uma engenharia financeira para dar aumento salarial, acima do reajuste da inflação.

“Quando ano após ano, o Estado não concede a reposição inflacionária, não cumpre os planos de carreira, retira as progressões, aumenta a contribuição previdenciária e aumenta o tempo de contribuição à previdência, o Estado está mentindo ao servidor e ao cidadão. Precisa parar de colocar um contra o outro. Se quer serviço de qualidade, os servidores precisam ter qualidade”, disse Professor Euler (PSD). Ele afirmou que se o Executivo disse que há espaço para a concessão, este é o momento oportuno para o reajuste ser efetivado.

“Estamos repondo o poder aquisitivo do vencimento dos servidores que, durante todo o período de pandemia, deram a sua cara à tapa, principalmente na saúde pública. Ninguém perguntou a eles na pandemia se eles queriam trabalhar mais. Isso foi imposto a eles e eles encararam. E encararam heroicamente. Só que agora chegou a hora do acerto”, defendeu Dalton Borba (PDT). “Os salários não podem sofrer redução. Se congelamos os salários, com inflação de dois dígitos, estão tendo redução, que é proibido [pela Constituição Federal]”, acrescentou.

Borba, contudo, ao discutir a aplicação do reajuste aos agentes políticos e parlamentares, apesar de concordar com a legalidade e moralidade da proposta, disse que concordaria em buscar opções à medida. “Talvez de forma escalonada, numa perspectiva de apoiar a recuperação econômica do município”, sugeriu. Renato Freitas (PT) defendeu a importância da recomposição para a maioria do funcionalismo, cuja remuneração é inferior a cinco salários mínimos, mas discordou da necessidade de aplicar isso aos agentes políticos e parlamentares, cujas remunerações “não condizem com a realidade [da maioria da população]”.

"Não existirá momento oportuno para a reposição, pois a população criminaliza um pouco a política, sem entender a dimensão do que a gente faz aqui. O valor do salário de um secretário municipal hoje, pela responsabilidade que ele tem, uma vez que responde juridicamente com o seu CPF, não são vantajosos pela resposta que eles têm que dar. É necessária inclusive a valorização do agente político", defendeu Mauro Bobato (Pode).

Autoras da outra emenda rejeitada, que propunha pagar o INPC, em vez do IPCA, Carol Dartora, Professora Josete e Maria Leticia focaram na recomposição dos salários dos servidores públicos cuja remuneração é mais baixa. “Mais de 70% dos servidores ganha de um a cinco salários-mínimos”, informou Dartora, para depois Maria Leticia reforçar que é preciso socorrer os funcionários que vivem com “salário de subsistência”. “A inflação atinge de forma mais agressiva os mais pobres, e também tivemos uma alta muito grande das tarifas de água e de energia”, completou Josete.

Para conferir a íntegra das discussões, clique aqui.

Diferente de outros Legislativos pelo país, os vereadores de Curitiba não recebem nenhum tipo de indenização pela realização da sessão extraordinária durante o recesso parlamentar.